Desdobramento da antiga mostra realizada em Porto Alegre no ano passado, que foi paralisada em decorrência das fortes chuvas que atingiram o estado naquele período, a exibição compila móveis, utensílios domésticos, ferramentas de trabalho, fotografias, materiais gráficos e vestimentas. Os itens foram reunidos ao longo de seis décadas pelo casal de colecionadores Calito e Tina Azevedo Moura em viagens por municípios do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná.
Dispensador de barbante de ferro fundido, em forma de gato
DelRe-Stein/VivaFoto
Ao ganhar novos contornos, a exposição ressalta um recorte das múltiplas contribuições que formam a diversidade brasileira, como enfatiza a historiadora de design. A partir da chegada dos europeus ao Brasil – que tinham um propósito e condições diferentes dos povos escravizados -, a cultura e o desenho de móveis e objetos foram enriquecidos por olhares distintos baseados em vivências particulares.
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Ligação com a contemporaneidade
Manteigueiras coloridas feitas de madeira
DelRe-Stein/VivaFoto
“Uma questão que me moveu ao trazer a exposição para a capital paulista foi o fato de que atualmente ainda recebemos muitos estrangeiros, como bolivianos, paraguaios, haitianos, nigerianos, sírios, entre outros. Assim, como nas ondas migratórias de alemães e italianos, que são o foco da mostra, essas pessoas mudaram-se em busca de melhores condições de vida, já que estavam vivendo em situação de privação e enfrentando dificuldades em seus países de origem”, comenta a jornalista. Ademais, faz uma observação sobre a importância de nos atentarmos ao modo como os indivíduos que buscam refúgio no Brasil estão sendo acolhidos e a preservação de seus valores, que são capazes de gerar múltiplos aprendizados.
Placa decorativa em alemão que diz: “Decore o seu lar”
DelRe-Stein/VivaFoto
Outro aspecto mencionado pela curadora que conecta-se aos dias atuais envolve a vitalidade da indústria moveleira característica dos estados sulistas brasileiros e a significativa relevância econômica dessas localidades. “Essa vitalidade do setor vem do empreendedorismo desses imigrantes, com essas raízes fincadas há muitos anos”, reflete.
Eixos temáticos
Porta de madeira maciça policromada
DelRe-Stein/VivaFoto
Separada em dez núcleos e uma sala de vídeo, a exibição tem como fio condutor a beleza e o design de peças que não foram criadas para a elite, “mas para seres humanos comuns, que contribuíram para a formação de uma memória coletiva baseada em trocas culturais”. Diante deste panorama, o público terá a possibilidade de reconhecer elementos que fazem parte de atividades rotineiras, o que pode ampliar a identificação com a coleção.
Logo no trecho inicial, batizado de Pode entrar que a casa é sua, o destaque são as portas, representações simbólicas da conexão entre o interior e o exterior das moradas. Feitas todas à mão com cedro, cabreúva ou canjerana, elas representam o esmero dos artesãos na produção desses elementos de passagem. “O vocabulário visual é muito marcante, com tonalidades contrastantes e uso de muitas formas geométricas”, pontua Adélia.
Cavalinho feito de madeira maciça e crina de cavalo
DelRe-Stein/VivaFoto
Frequentemente citadas quando se pensa em design, as cadeiras e os banquinhos protagonizam a seção As várias formas do sentar, que estará posicionada à frente da categoria inicial. Com particularidades que tornam as peças mais rústicas ou rebuscadas devido ao trabalho manual, o desejo de elevar os assentos para além da função básica diferencia cada artigo. “Também nota-se a pátina do tempo em vários momentos, o que é muito curioso”, diz Adélia.
Na mesma área, a ludicidade ganha força com os cavalinhos de madeira que eram confeccionados pelos padrinhos e dados de presente às crianças como uma demonstração de afeto entre os familiares. Sendo uma forma mais divertida de sentar devido ao movimento de balanço, eles refletem ainda o poder aquisitivo do responsável pela construção, conforme os elementos que os compõem.
Espremedor de cítricos feito madeira que faz parte da coleção Azevedo Moura
DelRe-Stein/VivaFoto
Já o conceito que retrata a cozinha como o coração da morada e ponto de encontro e celebração é representado no setor Preparar e servir o pão de cada dia. “Isso reafirma que a identidade de uma comunidade manifesta-se muito na comida e nos utensílios de preparo. Por exemplo: temos muitos potes de cerâmica utilizados no passo a passo do chucrute, prato típico alemão”, diz Adélia.
Formas metálicas com diferentes formatos destinadas para bolos e receitas quentes
DelRe-Stein/VivaFoto
Durante o percurso, os visitantes também vão conferir os setores Mande notícias do mundo de lá, com cartões postais trazem cenas românticas, O céu que nos protege, que apresentará como a religiosidade católica estava presente nas famílias italianas e Grafias de época, com a comunicação gráfica como folhetos publicitários.
No ambiente chamado Noivas de preto, as vestimentas escuras seriam uma forma de protesto. “Alguns historiadores falam sobre essa tradição da sociedade medieval em que as mulheres teriam que dormir com o senhor feudal em vez de ter a primeira noite com o noivo, o que teria perdurado até meados dos anos 1940. Entretanto, não há documentações que comprovem que os trajes realmente expressavam esse descontentamento”, elucida a historiadora de design.
O caminho prossegue por Infância nas colônias, onde serão observados os costumes e a criação das crianças, e, por fim, em Ferramentas do fazer, público terá detalhes sobre a atuação de marceneiros, ferreiros, oleiros, pedreiros, sapateiros, alfaiates e farmacêuticos.
Aceno à sustentabilidade
A respeito da cultura do descarte, Adélia Borges cita que a exposição Design e cotidiano na coleção Azevedo Moura evidencia uma realidade discrepante quando comparada aos dias de hoje. “Muitos artigos que reunimos na mostra atravessaram gerações e poderiam estar em vitrines de design contemporâneo. Essa é a longevidade dos itens tanto pela estética quanto pela técnica”, explana a especialista sobre a construção de objetos como legado, em crítica à obsolescência programada dos produtos e ao consumo excessivo.
Design e cotidiano na coleção Azevedo Moura
Local: sala de exposições temporárias, do Museu do Ipiranga
Endereço: Rua dos Patriotas, 100
Período: de 27/5 a 28/9/2025
Horários: de terça a domingo, das 10h às 17h. Última entrada: 16h
Entrada: gratuita (somente para esta exposição)
Mais informações no site
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