Por dentro da história e evolução do Guia Michelin

Com a curiosa história de ter sido criado por um fabricante de pneus, o Guia Michelin é considerado a maior autoridade em avaliação de restaurantes do mundo Quem se interessa por gastronomia, sabe o quanto as estrelas Michelin são valorizadas pelos restaurantes. Alcançar uma, duas ou até três estrelas é atestado de um restaurante da maior excelência, tanto na comida, quanto no ambiente e atendimento. Ainda, constar na publicação é estar entre os melhores restaurantes de uma região.
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Mas você conhece a história do Guia Michelin? Já parou para se perguntar por que uma marca de pneus se tornou uma referência tão importante na gastronomia? Conheça abaixo!
A história do Guia Michelin
O Guia Michelin não foi concebido como um icônico guia de restaurantes. Na verdade, sua origem é despretensiosa. O pequeno guia de capa vermelha tinha a simples missão de encorajar mais motoristas a pegarem a estrada.
No final do século 19, havia menos de 3 mil carros na França. Porém, os irmãos Andre e Edouard Michelin tinham uma grande visão para a indústria automobilística. Por isso, fundaram uma empresa de pneus com o nome da família, em Clermont-Ferrand, no centro da França.
Os irmãos queriam aumentar as vendas de carros e, por consequência, de pneus. Pensaram que incentivar viagens de carro seria importante naquele momento do mercado. Assim, tiveram a ideia de produzir um guia com informações úteis para viajantes, como mapas e listas com indicações de postos de gasolina, restaurantes e hotéis na França. Em 1900, nascia o Guia Michelin.
Nas duas primeiras décadas, o guia era distribuído gratuitamente. Até que, como conta a anedota, Andre Michelin chegou a uma loja de pneus e viu seus amados guias sendo usados para sustentar uma bancada de trabalho. Baseado no princípio de que “o homem só respeita verdadeiramente aquilo que paga”, um novo Guia Michelin foi lançado em 1920 e vendido por sete francos.
Outra diferença foi que o novo guia trazia listas de hotéis e restaurantes segundo categorias específicas. Reconhecendo a crescente influência da seção de restaurantes do guia, os irmãos Michelin também recrutaram uma equipe de clientes ocultos – ou inspetores de restaurantes, como são chamados hoje – para visitar e avaliar restaurantes anonimamente.
Em 1926, o guia começou a conceder estrelas aos restaurantes em destaque, marcando-os inicialmente com uma única estrela. Cinco anos depois, uma hierarquia de zero, uma, duas e três estrelas foi introduzida e, em 1936, os critérios para o ranking foram publicados: uma estrela para “restaurantes muito bons em suas categorias”; duas estrelas para “excelente cozinha; vale a visita”; e três estrelas para “gastronomia excepcional; vale uma jornada especial”.
Divulgação do Guia Michelin de 1911 para as Ilhas Britânicas
The Manchester Guardian/Wikimedia Commons
Com o sucesso, logo vieram edições sobre novos países. O primeiro foi para a vizinha Bélgica, em 1911. Em seguida, outros países da Europa, como Itália, Espanha e Alemanha ganharam suas edições do Guia Michelin.
Somente quase um século depois, em 2006, o Guia Michelin cruzou o Atlântico, com uma edição de Nova York. Em seguida, passou a avaliar outras grandes cidades dos Estados Unidos. Em 2007, veio a primeira edição asiática, com restaurantes japoneses.
No restaurante estrelado Ginza Kitafuku, em Tóquio, no Japão, o ingrediente principal é o king crab
Instagram/@aleks_vaynberg/Reprodução
Geralmente associado à ideia de estabelecimentos caros e refinados, o Guia Michelin inclui restaurantes com valores mais acessíveis. Em 1997, ganhou a distinção Bib Gourmand, que faz referência à melhor relação entre qualidade e preço. Ainda, extrapolou os salões dos restaurantes, com comida de rua, como acontece na edição Bangkok, na Tailândia.
“A vocação do guia em 2025 é tão relevante quanto em 1900, que é tornar a busca de experiências inesquecíveis disponíveis para todos. A gastronomia é uma expressão do movimento de redescoberta de heranças culturais, que também estão nas ruas”, afirma Gwendal Poullennec, diretor internacional do Guia Michelin.
Atualmente, o guia avalia mais de 30 mil estabelecimentos em 47 destinos. E voltou a ser gratuito, em formato digital, no site ou no aplicativo. Em alguns círculos sociais, a marca Michelin passou a ser mais reconhecida pelo guia do que como fabricante de pneus.
“O Guia Michelin está há 125 anos descobrindo novos talentos. Desde sua criação, cruzou fronteiras, atravessou mares e revelou inúmeros talentos em todo o mundo. Não importa a idade, o tipo de cozinha e restaurante, celebramos profissionais cujo talento, dedicação e paixão têm inspirado gerações ao longo das décadas, criando experiências inesquecíveis que vão além para trazer magia à mesa. Devemos um agradecimento especial aos chefs e suas equipes, os protagonistas desta história”, comemora o diretor.
O Guia Michelin no Brasil
Os chefs duas estrelas na cerimônia de lançamento do Guia Michelin 2025 do Rio de Janeiro e São Paulo. Alex Atala mantem a distinção desde a primeira edição brasileira, em 2015
Divulgação
No Brasil, o Guia Michelin chegou em 2015, reunindo em uma única edição as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro. Nessa primeira edição, havia 16 estabelecimentos com uma estrela e um com duas estrelas – o D.O.M., do chef Alex Atala.
Muitos dos restaurantes e chefs estrelados na estreia do Guia Michelin no Brasil seguem ícones até hoje. Em São Paulo, eram destaques Dalva e Dito, também de Atala; Mani, de Helena Rizzo; e os japoneses Jun Sakamoto, Kinoshita e Kosushi. No Rio, o restaurante homônimo da chef Roberta Sudbrack, e o Olympe, do célebre chef francês Claude Troisgros e de seu filho Thomas.
Os chefs com uma estrela na cerimônia de lançamento do Guia Michelin 2025 do Rio de Janeiro e São Paulo
Divulgação
Porém, há muitas novidades. A recém-lançada edição de 2025 traz quatro novas estrelas. Dois restaurantes no Rio de Janeiro, Casa 201 e Oseille, e dois em São Paulo, Kanoe e Ryo Gastronomia, receberam suas primeiras estrelas. O Brasil conta com cinco restaurantes com duas estrelas, que renovaram a distinção: D.O.M., Evvai e Tuju em São Paulo e Lasai e Oro no Rio de Janeiro.
Além dos estrelados, o Guia Michelin 2025 traz 84 restaurantes recomendados, fazendo um panorama bem completo do cenário gastronômico do Rio de Janeiro e de São Paulo. Há propostas para todos os gostos.
Seleção de moritsuke snacks do Ryo Gastronomia, restaurante que recebeu sua primeira Estrela Michelin em 2025
Instagram/@ryogastronomia/@kenzo.san/Reprodução
Entre os estreantes, há restaurantes que exaltam os sabores da tradição culinária brasileira, como Sal Gastronomia e Le Jardin; os mais voltados ao mar, como Ocyá Ilha; os que trazem a gastronomia da Itália, como Babbo Osteria, Giulietta Carni, Marena Cucina e Trattoria Evvai; do Japão, como Goya Zushi e Shin Zushi; da Espanha, como Cala del Tanit; de Portugal, como Quinta da Henriqueta; e da Argentina, como Rufino Parrilla.
Chefs em ação no restaurante Oseille, em São Paulo, que recebeu uma Estrela Michelin em 2025
Instagram/@oseillerestaurante/Reprodução
“O nível gastronômico do Brasil, refletido em mil matizes nessas duas magníficas cidades, continua a demonstrar personalidade e constante progresso. Ao lado dos jovens talentos que descobrimos a cada ano, chefs que aplicam técnicas atuais tanto às receitas tradicionais quanto às mais inovadoras. Essa busca pela excelência no serviço e na sommellerie também produz um efeito muito positivo na experiência final do cliente”, afirma o diretor.
As polêmicas do Guia Michelin
O Brasil ainda não teve um restaurante avaliado com três estrelas. Atualmente, há 153 restaurantes considerados três estrelas no mundo, localizados em Dubai, Bélgica, França, Japão, Hong Kong, Macau, Coreia do Sul, Reino Unido, Áustria, Estados Unidos, Tailândia, Espanha, China, Itália, Suíça, Holanda, Taiwan, Singapura, Eslovênia, Suécia, Dinamarca, Noruega e Alemanha. Além do Brasil, os únicos destinos da América Latina que têm Guia Michelin são Argentina e México.
Críticos do Guia Michelin, principalmente nos Estados Unidos, afirmam que as avaliações são tendenciosas, privilegiando a gastronomia francesa. O jornalista Steven Kurutz do The New York Times escreveu em 2005 que o guia parecia favorecer restaurantes que “enfatizavam a formalidade e a apresentação” em vez de uma “abordagem casual para refeições requintadas”.
Alguns donos de restaurantes já pediram ao Guia Michelin que revogassem suas estrelas, porque sentiam que ela criava expectativas indesejáveis ​​nos clientes. Um caso notável foi o de Marco Pierre White, o primeiro chef britânico a receber três estrelas Michelin, que abandonou o seu restaurante e devolveu as suas estrelas em 1999, alegando monotonia pela pressão de mantê-las, e questionando a competência dos inspetores que as atribuíram.
Um caso trágico foi o do chef francês Bernard Loiseau, que teria cometido suicídio em 2003 após ouvir o boato de que seu restaurante de três estrelas, La Côte d’Or, seria rebaixado para duas estrelas.
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Sustentabilidade e diversidade no Guia Michelin
Temas fundamentais do século 21, sustentabilidade e diversidade são contemplados no Guia Michelin. Com homens comandando boa parte dos grandes restaurantes do mundo, o guia se orgulha em destacar o trabalho de mulheres na cozinha.
Exemplos são a catalã Carme Ruscalleda, que já somou sete estrelas por seus três restaurantes na Espanha; a francesa Anne-Sophie Pic, responsável por cinco restaurantes que, juntos, acumulam sete estrelas; e Maíra Freire, primeira sommelier brasileira a ser homenageada pelo seu trabalho à frente da adega do restaurante Lasai, com duas estrelas Michelin no Rio de Janeiro.
Em 2020, a distinção Estrela Verde foi criada para premiar os restaurantes do Guia Michelin mais empenhados na gastronomia sustentável, que combinam a excelência com a responsabilidade ecológica e representam um modelo de negócio ético. No guia brasileiro de 2025, há três restaurantes que se destacam pela sustentabilidade: A Casa do Porco, Corrutela e Tuju, todos em São Paulo.

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