Por que a padronagem cheia de firulas está em toda parte, das passarelas às cortinas? Quando o diretor criativo da Burberry, Daniel Lee, procurou inspiração para a coleção outono/inverno 2025 da marca, ele voltou-se para o lar. Não exatamente o seu lar, mas sim os grandes e boêmios casarões de campo que atraem os londrinos nos finais de semana (e também os clientes da Burberry) para um passeio rural. Esses interiores fabulosos, mas muitas vezes desbotados — marcados por papéis de parede pintados à mão, tapeçarias elaboradas e tecidos suntuosos — ganharam vida na passarela da Burberry em fevereiro, na forma de jaquetas de veludo brocado, vestidos adamascados e bolsas tipo alforje com motivos de tapeçaria.
Esses tecidos opulentos há muito fazem parte do estilo de vida da alta classe. “Historicamente, como os brocados e damascos eram feitos com materiais nobres como a seda e levavam muito tempo para serem produzidos, eram acessíveis apenas à nobreza”, explica Kristen Robinson, arquivista da Schumacher, que conta que esses tecidos se originaram na China e chegaram à Europa pela Rota da Seda. (Vale observar que isso mudou no início do século XIX, com a invenção do tear Jacquard, que tornou esses tecidos mais acessíveis ao público em geral).
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A Burberry não é a única grife a levar tecidos típicos de cortinas e tapetes para as passarelas. Algumas das marcas mais descoladas de Copenhague, como Stine Goya e Ganni, atualizaram o visual com suas cores vibrantes e estampas em formato grande, enquanto Emilia Wickstead e Sézane apostaram em silhuetas mais clássicas. Houve até inovações tecnológicas no processo de fabricação — a cultuada marca de moda masculina Kestin busca seus jacquards na Takisada, uma fábrica japonesa especializada, que transformou a trama delicada em um tecido resistente o suficiente para o uso cotidiano.
Tecidos táteis em um projeto de Laura Gonzalez
Stephan Julliard/Reprodução AD EUA
Esses tecidos não estão encontrando espaço apenas no guarda-roupa. Designers de interiores ao redor do mundo estão vendo crescer a demanda por tecidos texturizados. O marketplace de antiguidades online 1stDibs relatou que seu público está demonstrando um interesse crescente por esses materiais, com um aumento de 14% nas buscas pelos termos “brocado” ou “jacquard” em 2025, em comparação com o ano anterior. Já o Pinterest viu as buscas por “almofada jacquard” crescerem 125% e por “capas de almofadas brocadas” aumentarem 83% no último ano.
Pode parecer incomum que tecidos tão antigos estejam capturando o espírito do momento, mas a designer de interiores Laura Gonzalez, conhecida por seus projetos maximalistas (como a luxuosa loja de departamentos Printemps), vê esse interesse como algo oportuno. “Há um desejo por espaços que pareçam multifacetados, imersivos e cheios de história — talvez como uma reação a anos de minimalismo”, diz Gonzalez. “Esses tecidos adicionam profundidade e um luxo tátil que traz conforto em nosso mundo cada vez mais digital.”
Adam Charlap Hyman, compartilha do mesmo sentimento. “Em geral, parece haver um anseio por um tipo de beleza mais clássica nos interiores. E no mundo dos tecidos, damascos e brocados respondem a esse anseio.”
Hotel Hana em Paris, por Gonzalez
Stephan Julliard/Reprodução AD EUA
Ao longo da história, os brocados e damascos entraram e saíram da moda. “A partir do século XVIII, grandes arquitetos passaram a incentivar o uso desses tecidos na decoração de interiores”, observa a historiadora da arte Aziza Gril-Mariotte, autora de The Book of Printed Fabric, da Taschen. Gril-Mariotte credita a William Morris a revalorização desses tecidos nos interiores contemporâneos.
Mais tarde, no século XIX, quando o parisiense Frederic Schumacher abriu sua empresa em Nova York, em 1889, damascos e brocados vindos da França eram especialmente populares entre seus clientes. Uma década depois, o arquiteto Stanford White encomendaria à Schumacher o tecido Blue Room Lampas, precursor do brocado, para a Casa Branca em 1902. Jackie Kennedy também recorreria ao tecido em sua célebre restauração da Casa Branca em 1962.
Mas esses tecidos não são exclusivos de interiores tradicionais. “Por serem tão antigos e luxuosos, muitas vezes encontram espaço em ambientes modernistas — por exemplo, é possível vê-los no trabalho de Ward Bennett”, observa Charlap Hyman. “Nesses espaços, que de outra forma seriam minimalistas, o brocado ainda faz sentido, porque há algo tão ‘essencial’ e atemporal nele.”
Um recanto de leitura da BNR Interiors
Kate S. Jordan/Reprodução AD EUA
Para não sobrecarregar os ambientes, os designers estão utilizando esses tecidos opulentos de forma estratégica. “Esses tecidos, mais pesados do que algodão ou linho leves, funcionam bem em pequenas doses — uma almofada ou biombo estofado cria um visual em camadas que parece enraizado no tempo”, diz Christine Gachot, sócia do escritório Gachot. Eles também podem ser usados de forma monocromática ou em diferentes tons, para não parecerem datados. “Quando usados em cores mais claras ou brilhantes, eles parecem modernos e únicos”, acrescenta Nicole Fisher, fundadora do BNR Interiors, que trabalhou com tecidos ao longo de sua carreira, iniciada como estilista editorial de Lady Gaga sob a tutela de Nicola Formichetti.
Para deixar claro: não há nada de antiquado na forma como os designers de hoje estão reutilizando esses tecidos históricos. Em uma interpretação moderna do material, o coletivo multidisciplinar francês de design Uchronia colaborou com a Manufacture Prelle, uma fabricante de seda de Lyon, para criar uma linha inteira de jacquard de seda e cetim colorido, aplicados a almofadas, cabeceiras e cortinas. Da mesma forma, a designer têxtil e de interiores Flora Soames também criou uma releitura contemporânea de tecidos antigos. Para isso, abriu seu arquivo pessoal e lançou peças exclusivas por meio da coleção One Day Box.
A demanda por damascos não mostra sinais de desaceleração. A Anthropologie Home está lançando novas variações de móveis estampados, que “incluem novos jacquards, como a poltrona Lorelei com a estampa Irena e a cama Winnie com o listrado Landon”, segundo a diretora de marketing, Katherine Finder.
Uma casa em Nova York por Gachot
Nicole Franzen/Reprodução AD EUA
Esses tecidos estão encontrando espaço na casa além dos móveis. “Os tecidos têm um calor e uma textura que atraem os apaixonados por design, que veem almofadas, cobertores e revestimentos de parede como alternativas viáveis às pinturas e a outros itens tradicionalmente classificados como arte”, afirma Anthony Barzilay-Freund, diretor editorial da 1stDibs.
Quer as pessoas estejam recorrendo a esses tecidos para adicionar dimensão às suas cortinas ou aos seus closets, o atrativo parece ir além da estética. “Tecidos como esses nos lembram que um dos princípios-chave do design é evocar ou inspirar emoção”, diz Zak Profera, diretor criativo da Zak + Fox. “Num tempo em que tudo parece passageiro, há algo profundamente reconfortante na robustez e na complexidade desses tecidos.”
*Matéria originalmente publicada na Architectural Digest Estados Unidos.
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Esses tecidos opulentos há muito fazem parte do estilo de vida da alta classe. “Historicamente, como os brocados e damascos eram feitos com materiais nobres como a seda e levavam muito tempo para serem produzidos, eram acessíveis apenas à nobreza”, explica Kristen Robinson, arquivista da Schumacher, que conta que esses tecidos se originaram na China e chegaram à Europa pela Rota da Seda. (Vale observar que isso mudou no início do século XIX, com a invenção do tear Jacquard, que tornou esses tecidos mais acessíveis ao público em geral).
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Vai construir ou reformar? Seleção Archa + Casa Vogue ajuda você a encontrar o melhor arquiteto para o seu projeto
A Burberry não é a única grife a levar tecidos típicos de cortinas e tapetes para as passarelas. Algumas das marcas mais descoladas de Copenhague, como Stine Goya e Ganni, atualizaram o visual com suas cores vibrantes e estampas em formato grande, enquanto Emilia Wickstead e Sézane apostaram em silhuetas mais clássicas. Houve até inovações tecnológicas no processo de fabricação — a cultuada marca de moda masculina Kestin busca seus jacquards na Takisada, uma fábrica japonesa especializada, que transformou a trama delicada em um tecido resistente o suficiente para o uso cotidiano.
Tecidos táteis em um projeto de Laura Gonzalez
Stephan Julliard/Reprodução AD EUA
Esses tecidos não estão encontrando espaço apenas no guarda-roupa. Designers de interiores ao redor do mundo estão vendo crescer a demanda por tecidos texturizados. O marketplace de antiguidades online 1stDibs relatou que seu público está demonstrando um interesse crescente por esses materiais, com um aumento de 14% nas buscas pelos termos “brocado” ou “jacquard” em 2025, em comparação com o ano anterior. Já o Pinterest viu as buscas por “almofada jacquard” crescerem 125% e por “capas de almofadas brocadas” aumentarem 83% no último ano.
Pode parecer incomum que tecidos tão antigos estejam capturando o espírito do momento, mas a designer de interiores Laura Gonzalez, conhecida por seus projetos maximalistas (como a luxuosa loja de departamentos Printemps), vê esse interesse como algo oportuno. “Há um desejo por espaços que pareçam multifacetados, imersivos e cheios de história — talvez como uma reação a anos de minimalismo”, diz Gonzalez. “Esses tecidos adicionam profundidade e um luxo tátil que traz conforto em nosso mundo cada vez mais digital.”
Adam Charlap Hyman, compartilha do mesmo sentimento. “Em geral, parece haver um anseio por um tipo de beleza mais clássica nos interiores. E no mundo dos tecidos, damascos e brocados respondem a esse anseio.”
Hotel Hana em Paris, por Gonzalez
Stephan Julliard/Reprodução AD EUA
Ao longo da história, os brocados e damascos entraram e saíram da moda. “A partir do século XVIII, grandes arquitetos passaram a incentivar o uso desses tecidos na decoração de interiores”, observa a historiadora da arte Aziza Gril-Mariotte, autora de The Book of Printed Fabric, da Taschen. Gril-Mariotte credita a William Morris a revalorização desses tecidos nos interiores contemporâneos.
Mais tarde, no século XIX, quando o parisiense Frederic Schumacher abriu sua empresa em Nova York, em 1889, damascos e brocados vindos da França eram especialmente populares entre seus clientes. Uma década depois, o arquiteto Stanford White encomendaria à Schumacher o tecido Blue Room Lampas, precursor do brocado, para a Casa Branca em 1902. Jackie Kennedy também recorreria ao tecido em sua célebre restauração da Casa Branca em 1962.
Mas esses tecidos não são exclusivos de interiores tradicionais. “Por serem tão antigos e luxuosos, muitas vezes encontram espaço em ambientes modernistas — por exemplo, é possível vê-los no trabalho de Ward Bennett”, observa Charlap Hyman. “Nesses espaços, que de outra forma seriam minimalistas, o brocado ainda faz sentido, porque há algo tão ‘essencial’ e atemporal nele.”
Um recanto de leitura da BNR Interiors
Kate S. Jordan/Reprodução AD EUA
Para não sobrecarregar os ambientes, os designers estão utilizando esses tecidos opulentos de forma estratégica. “Esses tecidos, mais pesados do que algodão ou linho leves, funcionam bem em pequenas doses — uma almofada ou biombo estofado cria um visual em camadas que parece enraizado no tempo”, diz Christine Gachot, sócia do escritório Gachot. Eles também podem ser usados de forma monocromática ou em diferentes tons, para não parecerem datados. “Quando usados em cores mais claras ou brilhantes, eles parecem modernos e únicos”, acrescenta Nicole Fisher, fundadora do BNR Interiors, que trabalhou com tecidos ao longo de sua carreira, iniciada como estilista editorial de Lady Gaga sob a tutela de Nicola Formichetti.
Para deixar claro: não há nada de antiquado na forma como os designers de hoje estão reutilizando esses tecidos históricos. Em uma interpretação moderna do material, o coletivo multidisciplinar francês de design Uchronia colaborou com a Manufacture Prelle, uma fabricante de seda de Lyon, para criar uma linha inteira de jacquard de seda e cetim colorido, aplicados a almofadas, cabeceiras e cortinas. Da mesma forma, a designer têxtil e de interiores Flora Soames também criou uma releitura contemporânea de tecidos antigos. Para isso, abriu seu arquivo pessoal e lançou peças exclusivas por meio da coleção One Day Box.
A demanda por damascos não mostra sinais de desaceleração. A Anthropologie Home está lançando novas variações de móveis estampados, que “incluem novos jacquards, como a poltrona Lorelei com a estampa Irena e a cama Winnie com o listrado Landon”, segundo a diretora de marketing, Katherine Finder.
Uma casa em Nova York por Gachot
Nicole Franzen/Reprodução AD EUA
Esses tecidos estão encontrando espaço na casa além dos móveis. “Os tecidos têm um calor e uma textura que atraem os apaixonados por design, que veem almofadas, cobertores e revestimentos de parede como alternativas viáveis às pinturas e a outros itens tradicionalmente classificados como arte”, afirma Anthony Barzilay-Freund, diretor editorial da 1stDibs.
Quer as pessoas estejam recorrendo a esses tecidos para adicionar dimensão às suas cortinas ou aos seus closets, o atrativo parece ir além da estética. “Tecidos como esses nos lembram que um dos princípios-chave do design é evocar ou inspirar emoção”, diz Zak Profera, diretor criativo da Zak + Fox. “Num tempo em que tudo parece passageiro, há algo profundamente reconfortante na robustez e na complexidade desses tecidos.”
*Matéria originalmente publicada na Architectural Digest Estados Unidos.
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