A taipa de pilão é uma técnica construtiva ancestral, mas que tem encontrado cada vez mais espaço na arquitetura contemporânea. “Trata-se de um sistema em que a terra, misturada com agregados e, em alguns casos, estabilizada com cal ou cimento, é compactada em formas até formar paredes monolíticas de grande espessura”, explica o arquiteto David Bastos, do escritório DB Arquitetos.
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Essas formas, conhecidas como taipal, ajudam a sobrepor as camadas de barro até a altura desejada, dando origem a grandes blocos maciços estruturais. “O resultado é uma construção sólida, durável e com estética única, marcada pela textura e pelas nuances da própria terra”, destaca David.
Em Alto Paraíso de Goiás (GO), as paredes de taipa de pilão se destacam na casa projetada pelo escritório Simbiose Arquitetura
Bernardo Moreira/Divulgação
Segundo o arquiteto Bruno Ferreira Alvarenga, do escritório Simbiose Arquitetura, não se sabe ao certo quando a técnica surgiu, mas sua durabilidade é indiscutível. “A taipa de pilão é milenar e, ainda hoje, podemos encontrar edificações com mais de cinco mil anos em pé, em locais como Oriente Médio e Ásia”, aponta.
Gaobei Chengqi Lou, em Yongding (Fujian, China): o maior e mais famoso tulou, construído em taipa de pilão. Essa moradia coletiva circular já abrigou dezenas de famílias e hoje é Patrimônio Mundial da UNESCO
Lennartbj/Wikimedia Commons
O arquiteto Márcio V. Hoffmann, sócio-proprietário da Taipal Brasil, empresa especializada em construções de terra, também relata que construções vernaculares feitas de barro podem ser encontradas em todos os continentes, com diversas técnicas e expressões estéticas.
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“Exemplos são a antiga cidade de Xibã, no Iêmen; os grandes anéis de moradias coletivas em Yongding, na China; a fortaleza em Baños de la Encina, na Espanha; e os remanescentes da cidade de Chan Chan, no Peru”, detalha.
Construção milenar feita em taipa de pilão em Baños de la Encina, município da Espanha
Flickr/Fernando López/Creative Commons
No Brasil, a taipa de pilão foi, provavelmente, difundida com a chegada dos colonizadores europeus, que entraram em contato com o método por meio dos povos africanos e árabes. “Mas, sendo um material vernacular, assim como a rocha, a madeira e as fibras vegetais, as técnicas de construção com terra já eram usadas pelos povos originários”, diz Márcio.
O jardim interno da casa em Itupeva, interior de São Paulo, ocupa as pontas das paredes curvas de taipa de pilão. Projeto dos arquitetos Brunno Meireles e André Pavan, do escritório Meireles + Pavan
Fran Parente/Divulgação
O arquiteto Carlos Eduardo Gutheil, do também do escritório Simbiose Arquitetura, comenta que a técnica foi totalmente incorporada pela arquitetura colonial brasileira, tornando-se parte marcante de sua identidade. “Grande parte das igrejas mais importantes da arquitetura barroca, em Minas Gerais e Bahia, são construídas com taipa, além de sedes de engenhos e fazendas de café”, relata.
No projeto da designer de interiores Shirlei Proença, responsável pelos interiores, em parceria com o arquiteto Sergio Sampaio, as paredes de taipa de pilão ao lado da cozinha foram feitas com terra extraída do próprio local
Renato Navarro/Divulgação
Márcio lembra, no entanto, que as pessoas ainda confundem a taipa de pilão com a taipa de mão, mais conhecida como pau a pique. “São duas técnicas diferentes de construção com terra. A taipa de mão é feita com a aplicação de diversas camadas de barro sobre uma trama de madeira”, fala.
A taipa de mão é utilizada apenas para vedações e paredes não estruturais, que são menos densas e resistentes. “A taipa de pilão é compactada com o uso de pilões dentro de formas, resultando em um bloco monolítico com altíssima densidade e resistência, além de melhor acabamento e inércia térmica”, aponta Bruno.
Modernização da técnica
Hoje, embora o princípio seja o mesmo de séculos atrás, o processo de construção em taipa de pilão foi modernizado. Além disso, a taipa é frequentemente associada a estruturas de concreto ou aço, permitindo atender às exigências normativas sem perder a sua essência.
“São usadas formas metálicas ou de madeira reaproveitável, compactadores mecânicos, em vez de soquetes manuais, e estabilizantes que garantem mais resistência e proteção contra a umidade”, relata David.
Para evitar entulhos, algumas paredes (ao meio) da casa em Alto Paraíso de Goiás (GO) fora feitas em taipa de pilão com barro local. Projeto do escritório Simbiose Arquitetura
Bernardo Moreira/Divulgação
De acordo com Márcio, atualmente há mais conhecimento sobre as características físicas e químicas do solo, aglomerantes para estabilização, formas com alta produtividade e compactadores pneumáticos do que existia no passado. “Esse conjunto garante e melhora a qualidade da taipa de pilão”, afirma.
Para Carlos, os processos de mecanização da taipa agilizaram a sua execução. “Formas mais eficientes e a redução da espessura aumentaram a versatilidade de situações onde podemos usá-la”, explica.
Alta durabilidade
Em termos de desempenho, a taipa de pilão surpreende. “Quando bem projetada e executada, pode durar séculos. Basta olhar para exemplares históricos que permanecem de pé”, comenta David.
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A resistência à compressão é comparável à da alvenaria comum, e o conforto térmico que proporciona é notável: as paredes espessas funcionam como massa térmica que regula a temperatura interna, criando ambientes naturalmente estáveis e confortáveis.
“Algumas das construções mais antigas da humanidade, incluindo trechos da Muralha da China, seguem em pé. Quando bem executadas, podem durar mais que o próprio concreto armado, sujeito à oxidação de sua armação”, afirma Bruno.
Solução sustentável
De acordo com Márcio, imóveis com quaisquer tipos de uso, como residencial, institucional ou mesmo industrial, podem ser construídos com taipa de pilão. “O importante é que o projeto respeite as características, as potencialidades e as fragilidades da técnica”, diz.
No projeto dos arquitetos Brunno Meireles e André Pavan, do escritório Meireles + Pavan, a parede feita com adobe de taipa pela Taipal envolve parte do térreo e parece apoiar o volume superior, que tem estrutura de concreto e paredes de alvenaria
Fran Parente/Divulgação
Para o proprietário da Taipal, no entanto, o tripé que tem impulsionado a arquitetura contemporânea construída com terra é a conservação do meio ambiente, mais salubridade e maior conforto proporcionado pelo design biofílico.
“A terra é um material com excelente desempenho, grande resistência e de enorme beleza. Com bons projetos e construtores competentes, será um dos protagonistas de um mundo mais sustentável”, avalia.
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Para os arquitetos da Simbiose Arquitetura, a terra é indicada para projetos que visam menor pegada energética — visto que não sofre nenhum processo de beneficiamento ou industrialização —, e para construções preocupadas com fatores bioclimáticos, pois é um dos materiais mais eficientes para garantir conforto térmico, tanto em regiões quentes como frias.
A garagem combina painel de muxarabi com parede lateral construída de taipa de pilão. O barro usado na construção foi retirado da falésia do próprio terreno. Projeto do escritório DB Arquitetos
Denilson Machado/MCA Estúdio/Divulgação
David aponta que a taipa de pilão oferece uma linguagem arquitetônica que dialoga com a paisagem e confere personalidade ao projeto. “Muitos optam por esse material não apenas pela sustentabilidade — o uso da terra local reduz transporte e emissão de carbono —, mas também pelo caráter estético e simbólico: a parede de taipa não precisa de revestimento, é ela própria a expressão da arquitetura”, diz.
Segundo ele, a opção pela técnica nasce, geralmente, do desejo de alinhar sofisticação e naturalidade. “A terra compactada cria superfícies contínuas, de grande beleza plástica, que ao mesmo tempo se conectam ao entorno e trazem conforto ambiental”, afirma David.
Barbeiro: mito ou verdade?
A taipa já foi bastante estigmatizada pela associação com a doença de Chagas, causada pelo protozoário Trypanosoma cruzi, cujo inseto vetor é o mosquito Triatoma infestans, conhecido como barbeiro. Mas, segundo os especialistas, isso é apenas um mito.
A taipa de pilão é uma técnica construtiva ancestral que utiliza terra crua, geralmente misturada com areia, argila e, às vezes, fibras vegetais, compactada em fôrmas de madeira chamadas taipais
GettyImages
“De fato, nunca foi verdade. O barbeiro prefere construções feitas de terra. O seu habitat são residências com frestas, trincas, sem saneamento ou coleta de lixo. Lugares assim foram associados às casas de barro. Mas casas de taipa bem construídas e bem atendidas pelo Estado não têm nenhuma relação com a doença”, pontua Márcio.
A terra não transmite doença de Chagas, mas o seu portador, o barbeiro, costuma fazer ninhos em paredes sem acabamento e com buracos. “Essa situação normalmente está associada a regiões com graves problemas de moradia, onde a terra é utilizada como solução à falta de materiais convencionais. Problemas decorrentes de doenças tropicais, via de regra, são resultado de omissão e falta de assistência”, frisa Bruno.
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Essas formas, conhecidas como taipal, ajudam a sobrepor as camadas de barro até a altura desejada, dando origem a grandes blocos maciços estruturais. “O resultado é uma construção sólida, durável e com estética única, marcada pela textura e pelas nuances da própria terra”, destaca David.
Em Alto Paraíso de Goiás (GO), as paredes de taipa de pilão se destacam na casa projetada pelo escritório Simbiose Arquitetura
Bernardo Moreira/Divulgação
Segundo o arquiteto Bruno Ferreira Alvarenga, do escritório Simbiose Arquitetura, não se sabe ao certo quando a técnica surgiu, mas sua durabilidade é indiscutível. “A taipa de pilão é milenar e, ainda hoje, podemos encontrar edificações com mais de cinco mil anos em pé, em locais como Oriente Médio e Ásia”, aponta.
Gaobei Chengqi Lou, em Yongding (Fujian, China): o maior e mais famoso tulou, construído em taipa de pilão. Essa moradia coletiva circular já abrigou dezenas de famílias e hoje é Patrimônio Mundial da UNESCO
Lennartbj/Wikimedia Commons
O arquiteto Márcio V. Hoffmann, sócio-proprietário da Taipal Brasil, empresa especializada em construções de terra, também relata que construções vernaculares feitas de barro podem ser encontradas em todos os continentes, com diversas técnicas e expressões estéticas.
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“Exemplos são a antiga cidade de Xibã, no Iêmen; os grandes anéis de moradias coletivas em Yongding, na China; a fortaleza em Baños de la Encina, na Espanha; e os remanescentes da cidade de Chan Chan, no Peru”, detalha.
Construção milenar feita em taipa de pilão em Baños de la Encina, município da Espanha
Flickr/Fernando López/Creative Commons
No Brasil, a taipa de pilão foi, provavelmente, difundida com a chegada dos colonizadores europeus, que entraram em contato com o método por meio dos povos africanos e árabes. “Mas, sendo um material vernacular, assim como a rocha, a madeira e as fibras vegetais, as técnicas de construção com terra já eram usadas pelos povos originários”, diz Márcio.
O jardim interno da casa em Itupeva, interior de São Paulo, ocupa as pontas das paredes curvas de taipa de pilão. Projeto dos arquitetos Brunno Meireles e André Pavan, do escritório Meireles + Pavan
Fran Parente/Divulgação
O arquiteto Carlos Eduardo Gutheil, do também do escritório Simbiose Arquitetura, comenta que a técnica foi totalmente incorporada pela arquitetura colonial brasileira, tornando-se parte marcante de sua identidade. “Grande parte das igrejas mais importantes da arquitetura barroca, em Minas Gerais e Bahia, são construídas com taipa, além de sedes de engenhos e fazendas de café”, relata.
No projeto da designer de interiores Shirlei Proença, responsável pelos interiores, em parceria com o arquiteto Sergio Sampaio, as paredes de taipa de pilão ao lado da cozinha foram feitas com terra extraída do próprio local
Renato Navarro/Divulgação
Márcio lembra, no entanto, que as pessoas ainda confundem a taipa de pilão com a taipa de mão, mais conhecida como pau a pique. “São duas técnicas diferentes de construção com terra. A taipa de mão é feita com a aplicação de diversas camadas de barro sobre uma trama de madeira”, fala.
A taipa de mão é utilizada apenas para vedações e paredes não estruturais, que são menos densas e resistentes. “A taipa de pilão é compactada com o uso de pilões dentro de formas, resultando em um bloco monolítico com altíssima densidade e resistência, além de melhor acabamento e inércia térmica”, aponta Bruno.
Modernização da técnica
Hoje, embora o princípio seja o mesmo de séculos atrás, o processo de construção em taipa de pilão foi modernizado. Além disso, a taipa é frequentemente associada a estruturas de concreto ou aço, permitindo atender às exigências normativas sem perder a sua essência.
“São usadas formas metálicas ou de madeira reaproveitável, compactadores mecânicos, em vez de soquetes manuais, e estabilizantes que garantem mais resistência e proteção contra a umidade”, relata David.
Para evitar entulhos, algumas paredes (ao meio) da casa em Alto Paraíso de Goiás (GO) fora feitas em taipa de pilão com barro local. Projeto do escritório Simbiose Arquitetura
Bernardo Moreira/Divulgação
De acordo com Márcio, atualmente há mais conhecimento sobre as características físicas e químicas do solo, aglomerantes para estabilização, formas com alta produtividade e compactadores pneumáticos do que existia no passado. “Esse conjunto garante e melhora a qualidade da taipa de pilão”, afirma.
Para Carlos, os processos de mecanização da taipa agilizaram a sua execução. “Formas mais eficientes e a redução da espessura aumentaram a versatilidade de situações onde podemos usá-la”, explica.
Alta durabilidade
Em termos de desempenho, a taipa de pilão surpreende. “Quando bem projetada e executada, pode durar séculos. Basta olhar para exemplares históricos que permanecem de pé”, comenta David.
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A resistência à compressão é comparável à da alvenaria comum, e o conforto térmico que proporciona é notável: as paredes espessas funcionam como massa térmica que regula a temperatura interna, criando ambientes naturalmente estáveis e confortáveis.
“Algumas das construções mais antigas da humanidade, incluindo trechos da Muralha da China, seguem em pé. Quando bem executadas, podem durar mais que o próprio concreto armado, sujeito à oxidação de sua armação”, afirma Bruno.
Solução sustentável
De acordo com Márcio, imóveis com quaisquer tipos de uso, como residencial, institucional ou mesmo industrial, podem ser construídos com taipa de pilão. “O importante é que o projeto respeite as características, as potencialidades e as fragilidades da técnica”, diz.
No projeto dos arquitetos Brunno Meireles e André Pavan, do escritório Meireles + Pavan, a parede feita com adobe de taipa pela Taipal envolve parte do térreo e parece apoiar o volume superior, que tem estrutura de concreto e paredes de alvenaria
Fran Parente/Divulgação
Para o proprietário da Taipal, no entanto, o tripé que tem impulsionado a arquitetura contemporânea construída com terra é a conservação do meio ambiente, mais salubridade e maior conforto proporcionado pelo design biofílico.
“A terra é um material com excelente desempenho, grande resistência e de enorme beleza. Com bons projetos e construtores competentes, será um dos protagonistas de um mundo mais sustentável”, avalia.
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Para os arquitetos da Simbiose Arquitetura, a terra é indicada para projetos que visam menor pegada energética — visto que não sofre nenhum processo de beneficiamento ou industrialização —, e para construções preocupadas com fatores bioclimáticos, pois é um dos materiais mais eficientes para garantir conforto térmico, tanto em regiões quentes como frias.
A garagem combina painel de muxarabi com parede lateral construída de taipa de pilão. O barro usado na construção foi retirado da falésia do próprio terreno. Projeto do escritório DB Arquitetos
Denilson Machado/MCA Estúdio/Divulgação
David aponta que a taipa de pilão oferece uma linguagem arquitetônica que dialoga com a paisagem e confere personalidade ao projeto. “Muitos optam por esse material não apenas pela sustentabilidade — o uso da terra local reduz transporte e emissão de carbono —, mas também pelo caráter estético e simbólico: a parede de taipa não precisa de revestimento, é ela própria a expressão da arquitetura”, diz.
Segundo ele, a opção pela técnica nasce, geralmente, do desejo de alinhar sofisticação e naturalidade. “A terra compactada cria superfícies contínuas, de grande beleza plástica, que ao mesmo tempo se conectam ao entorno e trazem conforto ambiental”, afirma David.
Barbeiro: mito ou verdade?
A taipa já foi bastante estigmatizada pela associação com a doença de Chagas, causada pelo protozoário Trypanosoma cruzi, cujo inseto vetor é o mosquito Triatoma infestans, conhecido como barbeiro. Mas, segundo os especialistas, isso é apenas um mito.
A taipa de pilão é uma técnica construtiva ancestral que utiliza terra crua, geralmente misturada com areia, argila e, às vezes, fibras vegetais, compactada em fôrmas de madeira chamadas taipais
GettyImages
“De fato, nunca foi verdade. O barbeiro prefere construções feitas de terra. O seu habitat são residências com frestas, trincas, sem saneamento ou coleta de lixo. Lugares assim foram associados às casas de barro. Mas casas de taipa bem construídas e bem atendidas pelo Estado não têm nenhuma relação com a doença”, pontua Márcio.
A terra não transmite doença de Chagas, mas o seu portador, o barbeiro, costuma fazer ninhos em paredes sem acabamento e com buracos. “Essa situação normalmente está associada a regiões com graves problemas de moradia, onde a terra é utilizada como solução à falta de materiais convencionais. Problemas decorrentes de doenças tropicais, via de regra, são resultado de omissão e falta de assistência”, frisa Bruno.