Na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Uatumã, localizada nos municípios de São Sebastião do Uatumã e Itapiranga, no Amazonas, às margens do rio Uatumã e seus afluentes, jovens e adultos ribeirinhos estão aprendendo a fazer incensos 100% naturais usando recursos sustentáveis da própria floresta.
A iniciativa é coordenada pela Idesam, uma Organização Social de Interesse Público (OSCIP) que atua na Amazônia desde 2004, com patrocínio da plataforma estadunidense Global Giving, que financia projetos beneficentes ao redor do mundo, e da marca 3M.
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A primeira fase do projeto, chamado de Engajamento da Juventude no Uso Sustentável de Recursos Naturais na Amazônia, aconteceu entre junho e dezembro do ano passado. A segunda etapa, que deu origem à marca artesanal de incensos Essências do Uatumã, começou em fevereiro deste ano.
“O projeto surgiu como desdobramento dos trabalhos apresentados pelos jovens na primeira fase, a qual consistiu na oferta de um curso técnico em gestão de empreendimentos florestais de base comunitária, com foco no desenvolvimento econômico sustentável da região, em parceria com o Instituto Federal do Amazonas (IFAM)”, conta Aretha Alves, analista de projetos do Idesam.
Jovens participantes do projeto aprendem a fazer incensos usando recursos sustentáveis da floresta
Diego Toledano/Lume Criativa/Divulgação
O objetivo é envolver os jovens da RDS nas atividades produtivas e no uso sustentável dos recursos locais. Ao todo, 40 jovens, de 18 a 29 anos, foram capacitados para atuar na gestão de negócios comunitários, ampliando as oportunidades de geração de renda local.
Devido à vasta extensão — cerca de 425 mil hectares — e dos desafios logísticos do território, os alunos contaram com transporte, hospedagem e alimentação durante as oficinas.
O curso abordou temas como sustentabilidade, bioeconomia, empreendedorismo social e gestão de recursos florestais. “Além disso, os estudantes participaram de visitas técnicas a sistemas agroflorestais, à usina produtora de óleos e à marcenaria presentes na região, promovendo a integração entre a teoria e a prática”, conta Aretha.
O aromaterapeuta Roger Consoli ensina os ribeirinhos do Amazonas a fazerem incensos
Diego Toledano/Lume Criativa/Divulgação
Como resultado dessa formação, os alunos elaboraram e apresentaram projetos de pesquisa com propostas para agregar valor e gerar renda a partir do aproveitamento de resíduos sem destinação adequada. Um dos grupos propôs a criação de incenso de breu — resina vegetal extraída de árvores — e chegou a desenvolver um protótipo, fruto de pesquisas conduzidas pelos próprios participantes.
“O engajamento com o protótipo e com sua possível profissionalização foi tão significativo que, quando surgiu a oportunidade de uma segunda fase, identificou-se um forte potencial para estruturar uma nova cadeia produtiva”, aponta a analista de projetos.
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Com isso, surgiu a segunda fase do projeto, que contou com cerca de 25 pessoas, todas participantes do primeiro módulo. A capacitação das comunidades ribeirinhas na fabricação dos incensos artesanais foi ministrada pelo aromaterapeuta e perfumista botânico Roger Consoli, dono da Shakti Alquimia.
Ele entrou em contato com o projeto durante uma visita à Amazônia para conhecer de perto as almécegas (ou breeiros), de onde se extrai a resina do breu branco usada nos incensos de sua marca.
“Eu já utilizava essa resina há anos nos meus incensos, mas queria muito conhecer a árvore pessoalmente e o lugar de onde ela vinha. Na incensaria, o breu une e equilibra os demais aromas, intensifica a fumaça e ancora a vibração do incenso”, fala Roger.
Por serem mais grossos, os incensos de breu branco podem queimar por até 1h30min por vareta
Diego Toledano/Lume Criativa/Divulgação
Na viagem, ele notou interesse dos ribeirinhos na arte de fabricar os incensos com o insumo abundante na floresta. “Percebi que havia ali um desejo coletivo e latente de aprender a fazer incensos, e que isso poderia, além de tudo, gerar renda de forma sustentável com o que a floresta oferece”, relembra.
No último dia, em visita à Miniusina de Óleos Essenciais da RDS do Uatumã, conheceu os participantes do projeto da Idesam. “Quando voltei a São Paulo, desenhei o projeto de capacitação dos ribeirinhos e tentei viabilizá-lo por meio de financiamento privado junto a empresas. Não consegui e, por um tempo, achei que não daria certo. Mas, no final de 2024, recebi um convite do Idesam para retornar à região e liderar oficialmente essa capacitação”, conta.
A primeira fase da capacitação aconteceu em julho deste ano e, em setembro, a segunda etapa, mais prática. “E agora, no final de outubro, volto para concluir a terceira parte, a apresentação dos resultados para a comunidade, uma espécie de formatura dos participantes”, revela Roger.
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Durante o primeiro módulo da capacitação, Roger coletou e trouxe para o seu ateliê na capital paulista diversos materiais locais: serragem de várias madeiras, resíduos de breu, talas de bacaba (palmeira amazônica), goma de mandioca produzida nas comunidades e carvão vegetal feito por eles.
“Foi um trabalho muito intenso, porque a goma de mandioca é naturalmente fraca como aglutinante. Precisei realizar entre 40 e 50 testes até chegar à fórmula e ao método de fabricação ideais. No final, consegui desenvolver um protocolo de produção totalmente novo, diferente do que uso nos meus incensos, mas perfeitamente adaptado à realidade e aos recursos das comunidades locais”, relata o aromaterapeuta.
Com isso, ele ensinou os participantes não apenas a fabricar o incenso a partir do resíduo de breu branco, mas também o protocolo correto para testar novos aromas, e as fórmulas e métodos para criar aromas — tanto com um único ingrediente quanto com sinergias entre eles.
“Orimar Sicsu, curandeiro — ou pajé, como é chamado na região — da comunidade do Livramento criou um incenso seguindo meus protocolos, usando três tipos diferentes de breu, para o tratamento de desordens respiratórias. É uma receita tradicional da floresta, chamada morrão, que ele adaptou para o formato de incenso e já está vendendo a R$ 20 a vareta”, conta Roger.
Como são feitos os incensos
Os incensos são moldados à mão um a um, de maneira artesanal. Para a produção, são utilizados apenas cinco insumos locais de manejo sustentável: serragem de madeira, resíduo de breu branco, goma de mandioca, carvão, tala da palmeira bacaba e água.
A resina de breu e o pó de serragem provêm de cadeias produtivas já fomentadas na região. A primeira vem da Miniusina de Óleos Essenciais, da qual se extrai o óleo essencial de forma responsável. Já o segundo provém da marcenaria comunitária, localizada na comunidade de São Francisco das Chagas do Caribi, que produz peças de madeira com selo Forest Stewardship Council (FSC) de manejo sustentável.
O pó de serragem de origem local, que seria descartado, é usado como insumo para fazer os incensos
Diego Toledano/Lume Criativa/Divulgação
“Os incensos de breu branco são produzidos a partir do reaproveitamento de resíduos da Miniusina de Óleos Essenciais, que seriam descartados, e também da serragem gerada na marcenaria comunitária, que teria o mesmo destino”, detalha o aromaterapeuta.
Os demais insumos — carvão, goma de mandioca e água — são adquiridos no comércio local e em municípios próximos à RDS, como Itapiranga ou São Sebastião do Uatumã. “A opção do uso de insumos de fácil acesso visa garantir que, mesmo após o encerramento do projeto, esse subproduto continue sendo produzido de forma simples e autônoma”, declara Aretha.
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Outras plantas aromáticas nativas podem ser usadas nos incensos, como a laranjinha (arbusto de folhas cítricas usado em chás calmantes), a preciosa (árvore com perfume semelhante à canela), a envirataia (usada tradicionalmente para defumações de limpeza energética) e a alfavaca (erva muito perfumada e abundante na região).
“Até a vareta do incenso é resultado de uma solução local e sustentável: como o bambu não existe na região, desenvolvemos uma alternativa usando a tala da folha de uma palmeira nativa chamada bacaba. E o mais interessante é que utilizamos apenas as folhas mortas já caídas, sem causar nenhum impacto à planta”, comente Roger.
Os incensos do Uatumã foram expostos no 12° Simpósio Brasileiro de Óleos Essenciais (SBOE), em Manaus, em outubro de 2025
Diego Toledano/Lume Criativa/Divulgação
A produção do incenso é realizada integralmente pela comunidade, e toda a receita das vendas é creditada diretamente à parceira local — Associação Agroextrativista das Comunidades da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Uatumã (AACRDSU) — para ser usada na aquisição de máquinas e equipamentos ou outros investimentos.
“Por ser 100% natural e emitir fumaça atóxica, cada caixa leva para o lar do consumidor um pedaço da floresta amazônica, a história de uma produção justa e sustentável, e os benefícios tradicionalmente associados à resina de breu — como sensação de calma, foco, descongestionamento respiratório e reconexão com o ambiente”, indica Aretha.
Além da comercialização, o projeto capacita os jovens para gerirem negócios comunitários, com aulas de precificação, marketing e gestão da produção.
“A capacitação foi uma experiência única. Eu acho que para cada um que participou, jovem, adulto, professor, alunos que foram, a gente teve a oportunidade de aprender algo novo, algo diferenciado, porque ninguém imaginaria que na RDS poderia criar um incenso do breu”, fala a participante Vanderlene Morais.
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O incenso de breu Essências do Uatumã vem em duas apresentações: caixa com 4 varetas (preço médio entre R$ 50 e R$ 60) e caixa com 8 varetas (R$ 90).
“As caixas têm menos varetas do que os incensos tradicionais devido à espessura e ao peso de cada unidade, que são, em média, três vezes maiores do que o convencional. Isso proporciona um tempo de queima significativamente superior, podendo chegar a 1h30 por vareta”, fala a analista de projetos.
Impacto positivo nas comunidades
Em outubro, os participantes realizaram o primeiro teste de comercialização no 12° Simpósio Brasileiro de Óleos Essenciais (SBOE), em Manaus. O evento contou com a presença dos próprios produtores, o que permitiu apresentar a história dos incensos e a origem dos insumos.
“Diante da ótima recepção do público, prevemos um novo lote para ampliar as vendas — ainda não em nível de atacado de grandes volumes, mas já com foco em chegar à casa dos consumidores”, aponta Aretha.
Os incensos artesanais são produzidos a partir do reaproveitamento de resíduos de breu branco, uma resina vegetal
Diego Toledano/Lume Criativa/Divulgação
Para ela, o projeto contribuiu para o fortalecimento da visão de que a geração de renda pode acontecer de forma sustentável na região, mantendo a floresta em pé e sem deslocamento das famílias.
“Com essa base, a associação e os jovens estão mais preparados para dar o próximo passo: ampliar o portfólio de aromas do incenso, aperfeiçoar padrões de qualidade, ajustar a produção ao ritmo da demanda, fortalecer a comunicação do produto e consolidar canais de venda que assegurem remuneração direta ao produtor e recursos para a associação”, analisa Aretha.
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Para Roger, o trabalho com incensos naturais vai muito além do aroma. “É uma forma de gerar impacto real, valorizando a cultura local, fortalecendo comunidades e criando caminhos sustentáveis de renda. Para mim, é a prova de que, quando propósito e conhecimento se unem, é possível transformar vidas e preservar a floresta ao mesmo tempo”, avalia.
O aromaterapeuta acredita que, além do aprendizado técnico, o projeto fortalece a autonomia das comunidades, estimulando o protagonismo local e o desenvolvimento de novas habilidades produtivas.
O objetivo do projeto é envolver os jovens da região nas atividades produtivas e no uso sustentável dos recursos locais
Diego Toledano/Lume Criativa/Divulgação
“O projeto, para mim, foi muito gratificante principalmente porque foi para os jovens. Eu gostei muito, porque é uma coisa inovadora dentro da reserva. Precisamos de mais de projetos para engajamento dos jovens. Não imaginava que um dia eu ia fazer incenso”, relata a aluna Francian Pires.
Na avaliação de Roger, a iniciativa também contribui para a bioeconomia amazônica, ao gerar renda por meio do uso consciente de resíduos e da transformação de recursos florestais não madeireiros em produtos de qualidade e impacto positivo.
“Em resumo, é uma iniciativa que alia conhecimento tradicional, tecnologia artesanal e sustentabilidade, gerando resultados econômicos, sociais e ambientais duradouros”, pontua.
A iniciativa é coordenada pela Idesam, uma Organização Social de Interesse Público (OSCIP) que atua na Amazônia desde 2004, com patrocínio da plataforma estadunidense Global Giving, que financia projetos beneficentes ao redor do mundo, e da marca 3M.
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A primeira fase do projeto, chamado de Engajamento da Juventude no Uso Sustentável de Recursos Naturais na Amazônia, aconteceu entre junho e dezembro do ano passado. A segunda etapa, que deu origem à marca artesanal de incensos Essências do Uatumã, começou em fevereiro deste ano.
“O projeto surgiu como desdobramento dos trabalhos apresentados pelos jovens na primeira fase, a qual consistiu na oferta de um curso técnico em gestão de empreendimentos florestais de base comunitária, com foco no desenvolvimento econômico sustentável da região, em parceria com o Instituto Federal do Amazonas (IFAM)”, conta Aretha Alves, analista de projetos do Idesam.
Jovens participantes do projeto aprendem a fazer incensos usando recursos sustentáveis da floresta
Diego Toledano/Lume Criativa/Divulgação
O objetivo é envolver os jovens da RDS nas atividades produtivas e no uso sustentável dos recursos locais. Ao todo, 40 jovens, de 18 a 29 anos, foram capacitados para atuar na gestão de negócios comunitários, ampliando as oportunidades de geração de renda local.
Devido à vasta extensão — cerca de 425 mil hectares — e dos desafios logísticos do território, os alunos contaram com transporte, hospedagem e alimentação durante as oficinas.
O curso abordou temas como sustentabilidade, bioeconomia, empreendedorismo social e gestão de recursos florestais. “Além disso, os estudantes participaram de visitas técnicas a sistemas agroflorestais, à usina produtora de óleos e à marcenaria presentes na região, promovendo a integração entre a teoria e a prática”, conta Aretha.
O aromaterapeuta Roger Consoli ensina os ribeirinhos do Amazonas a fazerem incensos
Diego Toledano/Lume Criativa/Divulgação
Como resultado dessa formação, os alunos elaboraram e apresentaram projetos de pesquisa com propostas para agregar valor e gerar renda a partir do aproveitamento de resíduos sem destinação adequada. Um dos grupos propôs a criação de incenso de breu — resina vegetal extraída de árvores — e chegou a desenvolver um protótipo, fruto de pesquisas conduzidas pelos próprios participantes.
“O engajamento com o protótipo e com sua possível profissionalização foi tão significativo que, quando surgiu a oportunidade de uma segunda fase, identificou-se um forte potencial para estruturar uma nova cadeia produtiva”, aponta a analista de projetos.
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Com isso, surgiu a segunda fase do projeto, que contou com cerca de 25 pessoas, todas participantes do primeiro módulo. A capacitação das comunidades ribeirinhas na fabricação dos incensos artesanais foi ministrada pelo aromaterapeuta e perfumista botânico Roger Consoli, dono da Shakti Alquimia.
Ele entrou em contato com o projeto durante uma visita à Amazônia para conhecer de perto as almécegas (ou breeiros), de onde se extrai a resina do breu branco usada nos incensos de sua marca.
“Eu já utilizava essa resina há anos nos meus incensos, mas queria muito conhecer a árvore pessoalmente e o lugar de onde ela vinha. Na incensaria, o breu une e equilibra os demais aromas, intensifica a fumaça e ancora a vibração do incenso”, fala Roger.
Por serem mais grossos, os incensos de breu branco podem queimar por até 1h30min por vareta
Diego Toledano/Lume Criativa/Divulgação
Na viagem, ele notou interesse dos ribeirinhos na arte de fabricar os incensos com o insumo abundante na floresta. “Percebi que havia ali um desejo coletivo e latente de aprender a fazer incensos, e que isso poderia, além de tudo, gerar renda de forma sustentável com o que a floresta oferece”, relembra.
No último dia, em visita à Miniusina de Óleos Essenciais da RDS do Uatumã, conheceu os participantes do projeto da Idesam. “Quando voltei a São Paulo, desenhei o projeto de capacitação dos ribeirinhos e tentei viabilizá-lo por meio de financiamento privado junto a empresas. Não consegui e, por um tempo, achei que não daria certo. Mas, no final de 2024, recebi um convite do Idesam para retornar à região e liderar oficialmente essa capacitação”, conta.
A primeira fase da capacitação aconteceu em julho deste ano e, em setembro, a segunda etapa, mais prática. “E agora, no final de outubro, volto para concluir a terceira parte, a apresentação dos resultados para a comunidade, uma espécie de formatura dos participantes”, revela Roger.
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Durante o primeiro módulo da capacitação, Roger coletou e trouxe para o seu ateliê na capital paulista diversos materiais locais: serragem de várias madeiras, resíduos de breu, talas de bacaba (palmeira amazônica), goma de mandioca produzida nas comunidades e carvão vegetal feito por eles.
“Foi um trabalho muito intenso, porque a goma de mandioca é naturalmente fraca como aglutinante. Precisei realizar entre 40 e 50 testes até chegar à fórmula e ao método de fabricação ideais. No final, consegui desenvolver um protocolo de produção totalmente novo, diferente do que uso nos meus incensos, mas perfeitamente adaptado à realidade e aos recursos das comunidades locais”, relata o aromaterapeuta.
Com isso, ele ensinou os participantes não apenas a fabricar o incenso a partir do resíduo de breu branco, mas também o protocolo correto para testar novos aromas, e as fórmulas e métodos para criar aromas — tanto com um único ingrediente quanto com sinergias entre eles.
“Orimar Sicsu, curandeiro — ou pajé, como é chamado na região — da comunidade do Livramento criou um incenso seguindo meus protocolos, usando três tipos diferentes de breu, para o tratamento de desordens respiratórias. É uma receita tradicional da floresta, chamada morrão, que ele adaptou para o formato de incenso e já está vendendo a R$ 20 a vareta”, conta Roger.
Como são feitos os incensos
Os incensos são moldados à mão um a um, de maneira artesanal. Para a produção, são utilizados apenas cinco insumos locais de manejo sustentável: serragem de madeira, resíduo de breu branco, goma de mandioca, carvão, tala da palmeira bacaba e água.
A resina de breu e o pó de serragem provêm de cadeias produtivas já fomentadas na região. A primeira vem da Miniusina de Óleos Essenciais, da qual se extrai o óleo essencial de forma responsável. Já o segundo provém da marcenaria comunitária, localizada na comunidade de São Francisco das Chagas do Caribi, que produz peças de madeira com selo Forest Stewardship Council (FSC) de manejo sustentável.
O pó de serragem de origem local, que seria descartado, é usado como insumo para fazer os incensos
Diego Toledano/Lume Criativa/Divulgação
“Os incensos de breu branco são produzidos a partir do reaproveitamento de resíduos da Miniusina de Óleos Essenciais, que seriam descartados, e também da serragem gerada na marcenaria comunitária, que teria o mesmo destino”, detalha o aromaterapeuta.
Os demais insumos — carvão, goma de mandioca e água — são adquiridos no comércio local e em municípios próximos à RDS, como Itapiranga ou São Sebastião do Uatumã. “A opção do uso de insumos de fácil acesso visa garantir que, mesmo após o encerramento do projeto, esse subproduto continue sendo produzido de forma simples e autônoma”, declara Aretha.
Leia mais
Outras plantas aromáticas nativas podem ser usadas nos incensos, como a laranjinha (arbusto de folhas cítricas usado em chás calmantes), a preciosa (árvore com perfume semelhante à canela), a envirataia (usada tradicionalmente para defumações de limpeza energética) e a alfavaca (erva muito perfumada e abundante na região).
“Até a vareta do incenso é resultado de uma solução local e sustentável: como o bambu não existe na região, desenvolvemos uma alternativa usando a tala da folha de uma palmeira nativa chamada bacaba. E o mais interessante é que utilizamos apenas as folhas mortas já caídas, sem causar nenhum impacto à planta”, comente Roger.
Os incensos do Uatumã foram expostos no 12° Simpósio Brasileiro de Óleos Essenciais (SBOE), em Manaus, em outubro de 2025
Diego Toledano/Lume Criativa/Divulgação
A produção do incenso é realizada integralmente pela comunidade, e toda a receita das vendas é creditada diretamente à parceira local — Associação Agroextrativista das Comunidades da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Uatumã (AACRDSU) — para ser usada na aquisição de máquinas e equipamentos ou outros investimentos.
“Por ser 100% natural e emitir fumaça atóxica, cada caixa leva para o lar do consumidor um pedaço da floresta amazônica, a história de uma produção justa e sustentável, e os benefícios tradicionalmente associados à resina de breu — como sensação de calma, foco, descongestionamento respiratório e reconexão com o ambiente”, indica Aretha.
Além da comercialização, o projeto capacita os jovens para gerirem negócios comunitários, com aulas de precificação, marketing e gestão da produção.
“A capacitação foi uma experiência única. Eu acho que para cada um que participou, jovem, adulto, professor, alunos que foram, a gente teve a oportunidade de aprender algo novo, algo diferenciado, porque ninguém imaginaria que na RDS poderia criar um incenso do breu”, fala a participante Vanderlene Morais.
Leia mais
O incenso de breu Essências do Uatumã vem em duas apresentações: caixa com 4 varetas (preço médio entre R$ 50 e R$ 60) e caixa com 8 varetas (R$ 90).
“As caixas têm menos varetas do que os incensos tradicionais devido à espessura e ao peso de cada unidade, que são, em média, três vezes maiores do que o convencional. Isso proporciona um tempo de queima significativamente superior, podendo chegar a 1h30 por vareta”, fala a analista de projetos.
Impacto positivo nas comunidades
Em outubro, os participantes realizaram o primeiro teste de comercialização no 12° Simpósio Brasileiro de Óleos Essenciais (SBOE), em Manaus. O evento contou com a presença dos próprios produtores, o que permitiu apresentar a história dos incensos e a origem dos insumos.
“Diante da ótima recepção do público, prevemos um novo lote para ampliar as vendas — ainda não em nível de atacado de grandes volumes, mas já com foco em chegar à casa dos consumidores”, aponta Aretha.
Os incensos artesanais são produzidos a partir do reaproveitamento de resíduos de breu branco, uma resina vegetal
Diego Toledano/Lume Criativa/Divulgação
Para ela, o projeto contribuiu para o fortalecimento da visão de que a geração de renda pode acontecer de forma sustentável na região, mantendo a floresta em pé e sem deslocamento das famílias.
“Com essa base, a associação e os jovens estão mais preparados para dar o próximo passo: ampliar o portfólio de aromas do incenso, aperfeiçoar padrões de qualidade, ajustar a produção ao ritmo da demanda, fortalecer a comunicação do produto e consolidar canais de venda que assegurem remuneração direta ao produtor e recursos para a associação”, analisa Aretha.
Leia mais
Para Roger, o trabalho com incensos naturais vai muito além do aroma. “É uma forma de gerar impacto real, valorizando a cultura local, fortalecendo comunidades e criando caminhos sustentáveis de renda. Para mim, é a prova de que, quando propósito e conhecimento se unem, é possível transformar vidas e preservar a floresta ao mesmo tempo”, avalia.
O aromaterapeuta acredita que, além do aprendizado técnico, o projeto fortalece a autonomia das comunidades, estimulando o protagonismo local e o desenvolvimento de novas habilidades produtivas.
O objetivo do projeto é envolver os jovens da região nas atividades produtivas e no uso sustentável dos recursos locais
Diego Toledano/Lume Criativa/Divulgação
“O projeto, para mim, foi muito gratificante principalmente porque foi para os jovens. Eu gostei muito, porque é uma coisa inovadora dentro da reserva. Precisamos de mais de projetos para engajamento dos jovens. Não imaginava que um dia eu ia fazer incenso”, relata a aluna Francian Pires.
Na avaliação de Roger, a iniciativa também contribui para a bioeconomia amazônica, ao gerar renda por meio do uso consciente de resíduos e da transformação de recursos florestais não madeireiros em produtos de qualidade e impacto positivo.
“Em resumo, é uma iniciativa que alia conhecimento tradicional, tecnologia artesanal e sustentabilidade, gerando resultados econômicos, sociais e ambientais duradouros”, pontua.



