Em meio ao relato – puro entusiasmo e sensibilidade – narrado como um borbotão de ideias, lembranças e reflexões, o proprietário desta casa em São José do Rio Preto, SP, destaca o essencial da jornada que envolveu o projeto e a construção da morada para sua família de quatro filhos, diversos animais e plantas, assim como a própria coleção de arte. Para Beto Cocenza, idealizador do fórum Boomspdesign, afinal, trata-se de uma história de amizade.
As paredes de concreto aparente, as janelas sinuosas e os amplos painéis de vidro que ainda hoje chamam a atenção no condomínio do interior de São Paulo são o fruto doce de uma colaboração profissional estabelecida décadas atrás entre ele e Ruy Ohtake (1938-2021), que se desdobrou como um laço fraterno. “Chamei o Ruy para participar de uma protoexposição concebida por mim nos idos dos anos 2000, e cultivamos um vínculo profissional e pessoal desde então. Sempre eu como um aprendiz reverente diante do gênio, claro”, revela Beto sobre o contato que gerou inúmeras parcerias comerciais, agradáveis viagens a trabalho e a residência em questão.
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Vai construir ou reformar? Seleção Archa + Casa Vogue ajuda você a encontrar o melhor arquiteto para o seu projeto
A casa do colecionador Beto Cosenza, projetada por Ruy Ohtake, no interior de São Paulo
Ruy Teixeira
A edificação de cerca de 400 m² nasceu em 2009 atendendo às singularidades da família do curador. Questionando-se se era mesmo a hora de erguer uma casa, contou com a generosidade característica do mestre das curvas e cores: Ruy sugeriu fazer o projeto sem cobrar por isso, adaptando as soluções arquitetônicas e técnicas de acordo com o orçamento previsto – e depois ainda acompanhou a obra em visitas ocasionais. “Ele sempre dizia que fazer bonito não custa mais caro do que fazer feio”, diz Beto. O próprio filho de Ruy, o também arquiteto e designer Rodrigo Ohtake, observador do processo à distância, ratifica essa percepção ao relembrar que seu pai ostentava uma taxa de execução bastante alta de tudo aquilo que desenhou – justamente pela disposição em flexibilizar os planos até o limite adequado, encontrando viabilidade construtiva e financeira. “‘Arquitetura é obra realizada; se ficar no papel, é apenas exercício criativo’, costumava dizer Ruy”, conta o herdeiro multitalentoso.
Os espaços sociais fluidos ganharam móveis de alvenaria sinuosos, típicos do Ruy
Em outro canto do living, a estrutura projetada por Ruy Ohtake que faz as vezes de banco e mesa ampara, da esq. para a dir., escultura de Marcos Coelho Benjamim, cerâmica de Laerte Ramos, fragmento de obra da Outra Oficina para a Baccarat, escultura indígena que pertencia à avó de Beto Cocenza, vaso de Dror Benshetrit para a Rosenthal, e almofadas da By Kamy – banco Martelos, de Leo Capote, e luminária de Harry Allen completam a cena
Ruy Teixeira
Ainda no living, poltrona Pavo Real, design Patricia Urquiola para a Driade, e bancos de Zanini de Zanine, com escultura de Fernando Silvério (à esq.) e quebra-cabeça de pássaro, no Vitra Design Museum – na parede, tela de Oswaldo Teixeira
Ruy Teixeira
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Fato é que esse “exercício criativo” começou por um aspecto importante na obra de Ruy, especialmente forte no universo residencial: o lúdico. “Ele levou a sério os briefings de todos. Eu, minha mulher e até as crianças”, lembra Beto. “É por isso que na proposta inicial havia um escorregador junto à escada – único elemento dispensado –, além do concreto tingido ainda na massa, substituído por cimento comum e tinta devido ao valor elevado”, diverte-se. De resto, a moradia respeitou os contornos traçados já no primeiro croqui, que sabiamente contemplava os requisitos de todos, o impacto da passagem do tempo nos materiais, estruturas e áreas externas, além de um lugar adequado para o acervo do proprietário.
Paredes extensas amparam inúmeros itens da minha coleção, bem particular, de arte e design
No canto do living, cadeira vintage de Zanine Caldas, pintura da família de Beto Cocenza, de acervo pessoal, e tela de Alex Flemming – na parede da escada, obra Mosca, de Regina Silveira
Ruy Teixeira
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“Deu muito trabalho fazer o concreto armado com fôrmas de 10 cm para as paredes ficarem com aspecto ripado”, conta Beto sobre o dia a dia no canteiro de obras, ressaltando uma solução frequente no léxico de Ruy, eleita também para a casa. A explicação vem de Rodrigo, profundo conhecedor do legado paterno, para quem se trata de uma questão de escala: quando se vê a superfície de perto, essa dimensão precisa ser pequena se a intenção é alcançar um visual riscadinho. Missão centimetricamente cumprida, elas hoje servem de anteparo neutro para a coleção de peças de arte e design reunidas pelo morador desde a juventude.
“A casa é tailor-made, nos atende muito bem. Seria difícil servir para outra família
Suzi e Beto Cocenza posam junto à mascote Khadija, com gamela de Hugo França na parede
Ruy Teixeira
Na sala de jantar, mesa T-no1, design Todd Bracher para a Fritz Hansen, protótipo de cadeira de Ruy Ohtake (à esq.), cadeiras 3107, design Arne Jacobsen para a Fritz Hansen, e cadeira DAX, design Charles & Ray Eames para Herman Miller e Vitra (à dir.), tudo sob luminária PH 5, design Poul Henningsen para a Louis Poulsen, diante de telas com diversas versões da Santa Ceia, de autoria de J. Borges, Orlando Fuzinelli e outros artistas – o banco de madeira Ondulação, do Estúdio Rika, e a cadeira amarela de Keith Haring para a Vilac arrematam a composição
Ruy Teixeira
Outras máximas projetuais, cumpridas com precisão, também ganharam sentido no endereço pensado para, sobretudo, ser um lar. É o caso dos cinco quartos compactos e dotados de banheiros (há sete no total), que pareciam exagero à época, mas provaram sua razão de existir quando a prole chegou à adolescência. Salas de TV, estar e jantar generosas – as duas últimas, no térreo – completaram a fórmula que já estimulava a convivência em vez do isolamento. “Eu indagava se não seria demais a mesa de refeições para dez lugares, ainda que compatível com o tamanho do ambiente. Hoje em dia, com os namorados e agregados, até falta lugar”, conclui o cliente após 16 anos da inauguração.
+ Guá Arquitetura cria moradia permeada por cultura e artesanato locais em Belém
Na porta da garagem, cadeira Paulistano, de Paulo Mendes da Rocha, banco Alvorada, de Aciole Félix, e boneco Bicudo, de Rui Amaral
Ruy Teixeira
O jardim abraça a fachada curva da residência, traço típico de Ruy Ohtake
Ruy Teixeira
Ao descrever a ala social fluida e conectada com o exterior por meio dos vidros coloridos, a verve de Beto Cocenza reaparece com força total. “Com o tempo, as frutíferas cresceram no quintal e atraem diversos pássaros, de sanhaço a joão-de-barro, o que eu adoro. E avistamos até lagartos e galinhas-d’angola na área externa”, exulta. “Como foi tudo extremamente personalizado para a minha família e concebido com a máxima liberdade criativa, nossa identificação é total. Me esmero para fazer a manutenção sem alterar um detalhe sequer e assim manter o que mais importa. A casa é viva.”
*Matéria originalmente publicada na edição de novembro/2025 da Casa Vogue (CV 478), disponível em versão impressa, na nossa loja virtual e para assinantes no app Globo Mais.
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As paredes de concreto aparente, as janelas sinuosas e os amplos painéis de vidro que ainda hoje chamam a atenção no condomínio do interior de São Paulo são o fruto doce de uma colaboração profissional estabelecida décadas atrás entre ele e Ruy Ohtake (1938-2021), que se desdobrou como um laço fraterno. “Chamei o Ruy para participar de uma protoexposição concebida por mim nos idos dos anos 2000, e cultivamos um vínculo profissional e pessoal desde então. Sempre eu como um aprendiz reverente diante do gênio, claro”, revela Beto sobre o contato que gerou inúmeras parcerias comerciais, agradáveis viagens a trabalho e a residência em questão.
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A edificação de cerca de 400 m² nasceu em 2009 atendendo às singularidades da família do curador. Questionando-se se era mesmo a hora de erguer uma casa, contou com a generosidade característica do mestre das curvas e cores: Ruy sugeriu fazer o projeto sem cobrar por isso, adaptando as soluções arquitetônicas e técnicas de acordo com o orçamento previsto – e depois ainda acompanhou a obra em visitas ocasionais. “Ele sempre dizia que fazer bonito não custa mais caro do que fazer feio”, diz Beto. O próprio filho de Ruy, o também arquiteto e designer Rodrigo Ohtake, observador do processo à distância, ratifica essa percepção ao relembrar que seu pai ostentava uma taxa de execução bastante alta de tudo aquilo que desenhou – justamente pela disposição em flexibilizar os planos até o limite adequado, encontrando viabilidade construtiva e financeira. “‘Arquitetura é obra realizada; se ficar no papel, é apenas exercício criativo’, costumava dizer Ruy”, conta o herdeiro multitalentoso.
Os espaços sociais fluidos ganharam móveis de alvenaria sinuosos, típicos do Ruy
Em outro canto do living, a estrutura projetada por Ruy Ohtake que faz as vezes de banco e mesa ampara, da esq. para a dir., escultura de Marcos Coelho Benjamim, cerâmica de Laerte Ramos, fragmento de obra da Outra Oficina para a Baccarat, escultura indígena que pertencia à avó de Beto Cocenza, vaso de Dror Benshetrit para a Rosenthal, e almofadas da By Kamy – banco Martelos, de Leo Capote, e luminária de Harry Allen completam a cena
Ruy Teixeira
Ainda no living, poltrona Pavo Real, design Patricia Urquiola para a Driade, e bancos de Zanini de Zanine, com escultura de Fernando Silvério (à esq.) e quebra-cabeça de pássaro, no Vitra Design Museum – na parede, tela de Oswaldo Teixeira
Ruy Teixeira
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Fato é que esse “exercício criativo” começou por um aspecto importante na obra de Ruy, especialmente forte no universo residencial: o lúdico. “Ele levou a sério os briefings de todos. Eu, minha mulher e até as crianças”, lembra Beto. “É por isso que na proposta inicial havia um escorregador junto à escada – único elemento dispensado –, além do concreto tingido ainda na massa, substituído por cimento comum e tinta devido ao valor elevado”, diverte-se. De resto, a moradia respeitou os contornos traçados já no primeiro croqui, que sabiamente contemplava os requisitos de todos, o impacto da passagem do tempo nos materiais, estruturas e áreas externas, além de um lugar adequado para o acervo do proprietário.
Paredes extensas amparam inúmeros itens da minha coleção, bem particular, de arte e design
No canto do living, cadeira vintage de Zanine Caldas, pintura da família de Beto Cocenza, de acervo pessoal, e tela de Alex Flemming – na parede da escada, obra Mosca, de Regina Silveira
Ruy Teixeira
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“Deu muito trabalho fazer o concreto armado com fôrmas de 10 cm para as paredes ficarem com aspecto ripado”, conta Beto sobre o dia a dia no canteiro de obras, ressaltando uma solução frequente no léxico de Ruy, eleita também para a casa. A explicação vem de Rodrigo, profundo conhecedor do legado paterno, para quem se trata de uma questão de escala: quando se vê a superfície de perto, essa dimensão precisa ser pequena se a intenção é alcançar um visual riscadinho. Missão centimetricamente cumprida, elas hoje servem de anteparo neutro para a coleção de peças de arte e design reunidas pelo morador desde a juventude.
“A casa é tailor-made, nos atende muito bem. Seria difícil servir para outra família
Suzi e Beto Cocenza posam junto à mascote Khadija, com gamela de Hugo França na parede
Ruy Teixeira
Na sala de jantar, mesa T-no1, design Todd Bracher para a Fritz Hansen, protótipo de cadeira de Ruy Ohtake (à esq.), cadeiras 3107, design Arne Jacobsen para a Fritz Hansen, e cadeira DAX, design Charles & Ray Eames para Herman Miller e Vitra (à dir.), tudo sob luminária PH 5, design Poul Henningsen para a Louis Poulsen, diante de telas com diversas versões da Santa Ceia, de autoria de J. Borges, Orlando Fuzinelli e outros artistas – o banco de madeira Ondulação, do Estúdio Rika, e a cadeira amarela de Keith Haring para a Vilac arrematam a composição
Ruy Teixeira
Outras máximas projetuais, cumpridas com precisão, também ganharam sentido no endereço pensado para, sobretudo, ser um lar. É o caso dos cinco quartos compactos e dotados de banheiros (há sete no total), que pareciam exagero à época, mas provaram sua razão de existir quando a prole chegou à adolescência. Salas de TV, estar e jantar generosas – as duas últimas, no térreo – completaram a fórmula que já estimulava a convivência em vez do isolamento. “Eu indagava se não seria demais a mesa de refeições para dez lugares, ainda que compatível com o tamanho do ambiente. Hoje em dia, com os namorados e agregados, até falta lugar”, conclui o cliente após 16 anos da inauguração.
+ Guá Arquitetura cria moradia permeada por cultura e artesanato locais em Belém
Na porta da garagem, cadeira Paulistano, de Paulo Mendes da Rocha, banco Alvorada, de Aciole Félix, e boneco Bicudo, de Rui Amaral
Ruy Teixeira
O jardim abraça a fachada curva da residência, traço típico de Ruy Ohtake
Ruy Teixeira
Ao descrever a ala social fluida e conectada com o exterior por meio dos vidros coloridos, a verve de Beto Cocenza reaparece com força total. “Com o tempo, as frutíferas cresceram no quintal e atraem diversos pássaros, de sanhaço a joão-de-barro, o que eu adoro. E avistamos até lagartos e galinhas-d’angola na área externa”, exulta. “Como foi tudo extremamente personalizado para a minha família e concebido com a máxima liberdade criativa, nossa identificação é total. Me esmero para fazer a manutenção sem alterar um detalhe sequer e assim manter o que mais importa. A casa é viva.”
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