Em São Luís, a residência que preserva memórias tem janelas que se abrem para novos tempos Sete filhos, 20 netos, 69 bisnetos, 82 tataranetos e uma trineta. A extensa árvore genealógica da família Duailibe floresceu a partir de raízes fincadas à Rua do Sol, no centro histórico de São Luís, quando, na década de 1920, o jovem casal de imigrantes libaneses Zaquia e Miguel adquiriu e ampliou um casarão do séc. 19 ali localizado. Desde antes de abraçar tantas gerações, o imóvel de dois andares testemunhou a história brasileira: viu o país sair do Segundo Império e adentrar a República, presenciou a chegada de água canalizada, o crescimento e o adensamento da cidade, e a multiplicação das atividades comerciais e fabris na capital maranhense.
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Ruy Teixeira
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Ruy Teixeira
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“A casa foi construída em 1870, como mostra o brasão da fachada. Tem pé-direito de 4 metros e paredes com 50 a 80 centímetros de espessura”, relata Francisco Miguel Duailibe, atual proprietário da residência e um dos netos de Zaquia e Miguel. “Havia somente uma sala de banho, como era comum antigamente. Na reforma, em 1999, construímos mais três banheiros e três lavabos, mas mantivemos as características originais”, diz ele, que comprou e restaurou o local com a ajuda do escritório pernambucano Santos & Santos. Hoje, a Casa de Zaquia – como foi batizada em homenagem à matriarca – é locada para eventos, além de receber reuniões da própria família.
Aos 80 anos, minha avó Zaquia Duailibe me disse: ‘Nunca fui tão feliz como nesta casa’
A sala de jantar é preenchida por mobiliário restaurado, como as cadeiras francesas e o bufê estilo Dom José, além de objetos decorativos de diferentes épocas
Ruy Teixeira
A escada helicoidal, feita de pinho-de-riga, conduz aos três dormitórios
Ruy Teixeira
Em 1997, O centro histórico de São Luís foi reconhecido como Patrimônio Mundial pela Unesco
A arquitetura é eclética. “Há vários estilos reunidos, como colonial, clássico, neoclássico, art nouveau. Lembra muito o Palácio dos Leões, sede do governo do Maranhão”, explica Marco Antonio Lima, galerista e amigo dos Duailibe. “No térreo, na parte da frente, fica a área social, com living e sala de jantar. No meio, a área de convívio funcionava como sala de conversas, quando não havia televisão. E, no fundo, estão copa e cozinha”, afirma Marco. Para completar, a escada helicoidal de madeira atrai todos os olhares e exibe uma elegância que resiste bravamente ao tempo.
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Ruy Teixeira
Graças às exportações de algodão e outros produtos agrícolas, São Luís foi a quarta capital mais rica do Brasil no séc. 19, atrás de Salvador, Recife e Rio de Janeiro. Tamanha prosperidade refletiu-se nas construções do centro histórico, onde se concentrava o núcleo elitizado da sociedade. Com a crise econômica que abalou a região nos anos 1930 e 40, porém, muitas famílias se mudaram para residências menores em outras áreas da cidade. Não foi o caso de dona Zaquia, que viveu ali durante 75 anos. “Vivenciei a casa durante minha infância”, diz a bisneta Isabela Murad, que hoje é arquiteta. “Lembro muito bem da entrada, do vento que batia, dos arabescos, das portas altas, do piso de madeira e da escada. A proporção de tudo aquilo me chamava a atenção quando criança”, conta. “Minha bisavó sempre nos recebia com esfirras, caramelos e amêndoas libanesas. Ela era um amor, todos a adoravam.”
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Ruy Teixeira
Enquanto cenas felizes se multiplicavam dentro da morada, o entorno não tinha a mesma sorte. Com o tempo, a região passou por um processo de esquecimento e abandono, apesar de o bairro ter sido tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em 1974. Um levantamento do Corpo de Bombeiros e da Defesa Civil, realizado no final do ano passado, revelou que 70 construções históricas do local apresentam condições estruturais com grave nível de precariedade. Nesse cenário, o cuidado dos Duailibe em preservar o imóvel e disponibilizá-lo para acesso ao público se revela de importância singular.
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Ruy Teixeira
“Meus pais recebiam vários pedidos para realizar casamentos na residência, pois as pessoas a achavam muito bonita”, lembra Samir Murad, neto de Zaquia e de Miguel. “Nesta casa, várias gerações da nossa família deixaram suas marcas ao redor de farta mesa, com boas conversas, carinho e acolhimento.” Uma história secular e longe de um fim – ainda bem.
*Matéria originalmente publicada na edição de maio/2025 da Casa Vogue (CV 472), disponível em versão impressa, na nossa loja virtual e para assinantes no app Globo Mais.
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