Madeira Laminada Colada (MLC): o que é, vantagens e como usar na arquitetura

A madeira laminada colada (MLC), quando usada como elemento estrutural, é forte, resistente e sustentável. No Brasil, porém, ainda é pouco explorada e permanece restrita, em grande parte, a residências de alto padrão. A principal razão é cultural: a alvenaria segue como o padrão historicamente consolidado no país.
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“O concreto armado se consolidou como sinônimo de progresso e modernidade. A falta de conhecimento técnico sobre a madeira, a carência de mão de obra especializada e a ausência de uma cultura construtiva em madeira são barreiras que precisam ser superadas”, fala o engenheiro industrial Calil Neto, CEO da Rewood.
A baixa difusão também decorre do custo inicial mais alto e da desconfiança do brasileiro com os sistemas que usam madeira. “Mas isso está mudando, o consumindor vem buscando por construções mais rápidas, limpas e sustentáveis”, comenta o arquiteto Filipi Oliveira, do escritório mf+arquitetos.
A fachada lateral da casa, projetada pelo escritório mf+arquitetos, tem em primeiro plano o bloco com estrutura do sistema construtivo MLC, da Rewood, que abriga a ala íntima. Os pilares de eucalipto funcionam como brises e protegem a varanda da suíte máster, que está na ponta do volume
Fernando Guerra/Divulgação
Para Calil, romper o status quo é grande desafio do momento. “O objetivo é mostrar que é possível unir beleza, funcionalidade, viabilidade econômica e responsabilidade ambiental, inspirando uma nova geração a repensar a construção civil”, argumenta.
Ele também acredita que Brasil tem condições de liderar globalmente essa transição com recursos naturais, criatividade e urgência climática. “O que falta é coragem para romper com os paradigmas ultrapassados e abraçar soluções inovadoras que beneficiem não apenas o presente, mas também as gerações futuras”, diz.
O que é MLC?
A madeira laminada colada (MLC) — também descrita na NBR 7190 como madeira lamelada colada — é produzida a partir da colagem de lamelas, que são tábuas de madeira de dimensões menores, dispostas de forma que suas fibras fiquem paralelas entre si, em sentido longitudinal.
“Este processo industrial permite a criação de peças de grandes dimensões e com propriedades mecânicas controladas e previsíveis, superando as limitações da madeira maciça e oferecendo maior segurança e facilidade de uso para arquitetos e engenheiros”, fala Calil.
No projeto do escritório FGMF, o corredor lateral da casa é protegido por brises de MLC, da Rewood, que medem 30 x 7 cm e são fixos no piso e no teto
Fran Parente/Divulgação
Essa tecnologia permite a utilização da madeira como elemento estrutural em projetos de maior escala e complexidade. De alta resistência para aplicação na construção civil, a MLC pode ser usada em vigas, pilares, barrotes e mãos-francesas. “É como transformar a madeira em ‘concreto natural’, só que muito mais leve e sustentável”, diz Filipi.
O processo de fabricação da MLC inicia-se com a seleção rigorosa da matéria-prima, geralmente madeiras de reflorestamento como pinus e eucalipto, que passam por um processo de secagem e tratamento.
A estrutura da casa projetada pelo escritório NV Arquitetura foi feita de MLC, da Scheid Esquadrias, que oferece a mesma resistência do concreto
Lucas Franck/Divulgação
Em seguida, as lamelas (tábuas de madeira) são unidas no comprimento desejado por emendas dentadas (finger joints) e, posteriormente, coladas com adesivos estruturais e prensadas umas sobre as outras sob alta pressão, formando uma peça única, coesa e de alta resistência.
“Esse processo industrial garante peças estáveis, resistentes e muito precisas, prontas para serem usadas na obra, quase como um kit”, coloca o arquiteto Filipi.
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Hoje já existem indústrias no Brasil que produzem MLC com qualidade internacional, mas ainda é um mercado em crescimento.
“Atualmente, há pequenas empresas fazendo MLC em esquema mais ‘caseiro’. É importante evitar esse tipo de solução, que pode não atender às normas técnicas nacionais e internacionais. No caso de sistemas estruturais de fato, não brises ou pérgolas, por exemplo, é essencial a consulta de empresas especializadas”, alerta o arquiteto Fernando Forte, do escritório FGMF.
Projetada pelo escritório AMZ Arquitetos, a casa com estrutura de módulos e pilares de MLC possibilitou vãos de 4,45 x 4,80 m
Pedro Napolitano Prata/Divulgação
A madeira utilizada na fabricação da MLC no Brasil provém majoritariamente de florestas plantadas e reflorestadas de pinus e eucalipto.
“Essas florestas são manejadas de forma sustentável, garantindo suprimento contínuo e previsível de matéria-prima para a indústria. A rastreabilidade dessas madeiras é mais simples, o que facilita a obtenção de certificações ambientais, como o FSC (Forest Stewardship Council), que atestam a origem responsável do material”, explica Calil.
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O pinus é valorizado por sua trabalhabilidade e estabilidade dimensional, enquanto o eucalipto se destaca por sua alta resistência mecânica, o que permite a criação de estruturas mais esbeltas.ta. “A escolha entre as duas espécies depende das especificações do projeto e das propriedades mecânicas desejadas para o componente estrutural”, ele completa.
Quais as vantagens da MLC?
Segundo o Fernando, a MLC garante rapidez da montagem, controle de custos, evita desperdícios no canteiro e é mais sustentável do que uma estrutura similar em concreto moldado in loco.
“Há, ainda, a vantagem de sempre ser realizada com madeira de reflorestamento e certificada, em um ciclo positivo de industrialização e origem de matéria-prima. Além dessas vantagens, existe a questão estética e o fato de que, com o MLC, é possível vigas curvas e uma série de variações que uma estrutura de madeira convencional maciça não permite”, aponta.
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A arquiteta Grazzieli Gomes Rocha, sócia-diretora do escritório aflalo/gasperini arquitetos, cita entre as principais vantagens a alta resistência mecânica, a estabilidade dimensional, a possibilidade de vencer grandes vãos e a precisão industrial do processo.
A MLC permite liberdade criativa e de formatos muito superior à de outros materiais. Com ela, é possível criar curvas, arcos e geometrias que não seriam possíveis de se obter a partir de uma única tora ou mais difíceis — e caras — de se produzir em aço ou concreto. “O material permite flexibilidade arquitetônica e integração com outros sistemas construtivos”, ela destaca.
No projeto do o arquiteto Felipe Hess, os ambientes sociais ficam no pátio central com cobertura de placas de MLC da Crosslam e manta de termoacústica da Alwitra
Fran Parente/Divulgação
“Essa versatilidade abre um leque de possibilidades para o design arquitetônico, permitindo a criação de espaços amplos, com grandes vãos livres e formas orgânicas, sem a necessidade de múltiplos pilares de sustentação, o que resulta em projetos mais leves, elegantes e integrados à paisagem”, comenta Calil.
Além disso, a madeira é o único material de construção proveniente de fonte renovável e, durante o seu crescimento, sequestra dióxido de carbono da atmosfera, ajudando a mitigar as mudanças climáticas. Outro ponto é que a MLC tem baixo consumo energético no processo industrial e, por ser pré-fabricada, gera menos resíduos de obra e otimiza o transporte.
No projeto do escritório NV Arquitetura, a estrutura da casa foi feita com MLC e as paredes e os forros de eucalipto de reflorestamento
Lucas Franck/Divulgação
“A MLC utiliza madeira proveniente de florestas de silvicultura, o que permite reposição natural, reduz a pressão sobre florestas nativas e contribui para mitigação das mudanças climáticas. Apresenta baixo consumo de energia em comparação ao aço e ao concreto, retém CO₂ e possibilita reciclagem ao final do ciclo de vida”, fala João Pini, gerente de engenharia da Ita Engenharia em Madeira.
Quando vale a pena usar MLC?
Segundo o arquiteto Pablo Alvarenga, do escritório AMZ Arquitetos, a MLC pode ser usada em todos os tipos de projetos, do mais complexos aos mais simples.
“Não a enxergamos como ‘alternativa’ ao aço ou ao concreto, gostamos de conceber o projeto ou partes dele desde o começo em MLC. Ela sempre é uma boa opção quando queremos uma obra rápida e de baixo impacto ambiental. E também pela beleza da estrutura de madeira aparente”, revela.
No projeto do escritório mf+arquitetos, o hall de circulação da casa mostra a união dos volumes com a sobreposição da laje de concreto nos blocos de MLC
Fernando Guerra/Divulgação
A agilidade da construção em MLC é outro ponto positivo, o que torna a técnica ideal para quem quer ver a obra pronta logo.
“Em nossos projetos, a escolha pelo material nasce tanto do desejo estético quanto da busca por eficiência construtiva. Também faz sentido usá-la em terrenos de difícil acesso, já que as peças podem ser pré-fabricadas e transportadas com facilidade”, comenta Filipi.
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A pré-fabricação dos componentes em MLC acelera significativamente o tempo de construção e reduz a geração de resíduos no canteiro, tornando a obra mais limpa.
“Além disso, a madeira engenheirada oferece maior liberdade de projeto, permitindo vãos maiores e soluções arquitetônicas mais arrojadas. A escolha pela MLC também se justifica por seu apelo estético e pelos benefícios ambientais, já que a madeira é um material renovável que armazena carbono”, aponta Calil.
No projeto do escritório mf+arquitetos, a ala íntima é feita no sistema construtivo MLC e inclui os pilares de eucalipto, que funcionam como brises fixos, regulando a entrada de luz e proporcionando privacidade.
Fernando Guerra/Divulgação
Pablo destaca, ainda, a versatilidade. “A MLC trabalha muito bem em estruturas mistas, e pode ser usada junto com estruturas de concreto e estruturas metálicas”, comenta.
Quanto custa a MLC?
O custo inicial de usar MLC na parte estrutural é maior do que quando se utiliza concreto e até mesmo metal. Mas, em outros quesitos, esse valor acaba se equiparando.
Isso porque, embora a alvenaria tradicional geralmente apresente um custo direto mais baixo devido à maturidade do mercado, a construção em madeira lamelada colada oferece economias significativas em etapas críticas da obra.
No projeto do escritório NV Arquitetura, a estrutura feita de MCL, da Scheid Esquadrias, é o destaque do projeto, resultando em uma estrutura leve, resistente e sustentável, que não requer revestimentos ou rebocos
Lucas Franck/Divulgação
A leveza estrutural do material reduz o custo das fundações; a montagem rápida e industrializada diminui gastos com mão de obra, prazos e geração de resíduos; e o apelo estético pode eliminar despesas com revestimentos, compensando o maior investimento inicial.
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“Quando olhamos para o conjunto, menor tempo de obra, menos fundações, obra mais limpa e durabilidade, o investimento se equilibra e muitas vezes se paga no longo prazo”, comenta Filipi.
O projeto da arquiteta Solange Cálio traz espaço gourmet sob o pergolado de MLC com forro de madeira de demolição esbranquiçada, de Valter Marceneiro
Denilson Machado/MCA Estúdio/Divulgação
Além dos custos diretos da obra, é crucial considerar o impacto ambiental de longo prazo. Enquanto os métodos convencionais de construção emitem grandes quantidades de CO₂, a MLC sequestra aproximadamente uma tonelada de CO₂ por metro cúbico.
“Esse benefício, já reconhecido em mercados como Europa e América do Norte através de incentivos fiscais e certificações sustentáveis, representa um valor imensurável para as futuras gerações, tornando a MLC uma escolha financeiramente estratégica e ambientalmente responsável”, avalia Calil.
Qual é a durabilidade e resistência da MLC?
A durabilidade das estruturas de MLC é a mesma de uma convencional, mas existem cuidados que devem ser tomados em relação à exposição das peças.
“Com manutenção adequada e proteção contra umidade, ela pode durar tantas décadas quanto uma estrutura de concreto ou aço, em alguns casos até mais, pois não sofre corrosão”, comenta Filipi.
No projeto da arquiteta Solange Cálio, a água abastece o canal que circula no jardim, criado pelo LF Paisagismo, e cai no sumidouro em área descoberta, junto ao espaço gourmet, com estrutura de MLC apoiada na parede
Denilson Machado/MCA Estúdio/Divulgação
Calil enfatiza a importância de proteger a madeira da umidade, com detalhes construtivos como beirais generosos e sistemas de impermeabilização eficientes. “O tratamento da madeira em autoclave e a aplicação de produtos preservativos também são fundamentais para garantir sua longevidade”, aponta.
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“Em um ambiente hostil como o brasileiro, com clima quente e chuvoso e a proliferação de organismos xilófagos, como fungos e cupins, é imprescindível que o projeto de arquitetura esteja adequado às condições de exposição, com amplos beirais e madeira longe do contato com o solo”, reforça João.
Quanto a incêndios, a MLC possui resistência natural, em função das grandes dimensões das peças e do carvão que é formado na queima superficial. “Ele cria uma camada protetora que retarda a propagação das chamas e protege o miolo da peça”, explica João. Isso retarda a perda de resistência estrutural, permitindo a evacuação segura da edificação.

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