João Grinspum Ferraz não é chef profissional, mas em sua casa acontecem almoços e jantares disputados desde que a construção ficou pronta, em 2013. “Havia acabado de me separar quando mudei para cá. Estava solteiro e trabalhando sem horário fixo. Portanto, tinha disponibilidade para cozinhar e receber, mesmo que fosse tarde da noite”, diz. De brincadeira, os amigos apelidaram o local de Casa do Carbonara, pois essa era a especialidade do morador e o prato preferido dos frequentadores.
O nome virou site, perfil no Instagram, canal no YouTube e até hoje abarca os projetos de João na área de gastronomia – ele já publicou artigos, deu palestras, organizou debates, criou uma websérie e idealizou e dirigiu, ao lado de Fabio Meirelles, o documentário A Terra e o Prato (2020), que traz depoimentos de chefs de diversos países sobre a relação entre comida, cultura local e sustentabilidade. O burburinho nas redes sociais causado por esses primeiros encontros fez muita gente acreditar que o endereço escondia um restaurante secreto. “Cheguei a receber um casal que me escreveu pedindo uma reserva com sete meses de antecedência. Como ninguém faz isso no Brasil, decidi cozinhar para eles”, declara.
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Detalhe dos suportes de facas e utensílios
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
Em volta da lareira, banquinhos Caipira, de Francisco Fanucci, da Marcenaria Baraúna, quadro (branco) de Bruno Dunley, poltrona Jangada, de Jean Gillon, que João herdou do pai, dupla de cadeiras Tripé (edição de 1989), de Lina Bo Bardi, escultura amarela de Emanoel Araujo e, sobre a mesa de centro, obra de Ester Grinspum, tia do morador
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
O gosto pela culinária, João atribui à origem mineira da família paterna. Ele é filho do arquiteto Marcelo Ferraz, nascido em Carmo de Minas, e, durante a infância, passava as férias na casa da avó Aparecida, em Cambuí, na Serra da Mantiqueira (a matriarca estava prestes a completar 103 anos quando o neto foi entrevistado para esta reportagem). “Ainda criança, eu adorava ver a vó Cida preparar doce de fruta, lombinho assado, rosca…”, recorda-se João. “Cozinhar é uma parte importante da nossa vida familiar. Nas festas, todo mundo vai para o fogão”, completa. Do lado materno, vieram outros aprendizados. “Embora ninguém cozinhasse, meus avós gostavam de sair para comer em bons restaurantes. Fiz esse programa com eles muitas vezes, o que também foi fundamental em minha formação gastronômica”, afirma. Por volta dos 18 anos, houve a fase de mergulhar nos livros para descobrir novas técnicas e receitas. “Meu pai e meu irmão faziam piada nessa época, pois me tornei meio metódico e andava sempre com uma balança para pesar os ingredientes”, lembra.
+ Flores na gastronomia: como chefs têm usado plantas de forma atual e criativa
Detalhe do living, decorado com sofá Maria, de Marcelo Ferraz, da Marcenaria Baraúna, e tela de Paulo Monteiro
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
No living, a parede de concreto aparente expõe óleo de Paul Signac (à esq.), tela de Michel Kikoïne (ao centro), pôster original da Comuna de Paris (à dir.) e quadro de Emmanuel Nassar (no alto) – o avião é de Mestre Alvino, e, sobre o aparador da Marcenaria Baraúna, escultura de Amilcar de Castro
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
Outro ângulo da lareira evidencia a cadeira de Joaquín Torres-García
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
Além da gastronomia, João cultiva outras paixões. Formado em relações internacionais, fez mestrado em ciências políticas e doutorado em história. Durante um tempo, foi proprietário de galeria de arte. Com cabeça de pesquisador e olhar treinado para encontrar bons achados, mantém o hábito de vasculhar feirinhas, antiquários e catálogos de leilões. “Tenho uma tendência ao colecionismo, mas procuro me conter. Não há dinheiro nem espaço para tudo. Já me desfiz de muita coisa”, afirma. Entre os desapegos, esteve a poltrona Bowl, da arquiteta Lina Bo Bardi, original dos anos 1950, vendida ao acervo do MoMA de Nova York. “Lina era minha madrinha. Meu pai trabalhou com ela por 16 anos, depois foi diretor do Instituto Bardi por uma década. Fiquei feliz de colocar a peça num lugar onde ela pode ser apreciada por gente do mundo todo”, diz. Hoje, João é diretor da Marcenaria Baraúna, extensão do escritório Brasil Arquitetura, fundado por Marcelo Ferraz e Francisco Fanucci e responsável pelo projeto de sua casa. A empresa produz mobiliário sob medida e dispõe de um portfólio de design que inclui reedições autorizadas de criações de Lina.
+ Decor Stories: peças e artigos decorativos transformam a mesa posta
A biblioteca, localizada na edícula, recebeu estante da Marcenaria Baraúna, que reúne livros e obras de arte, como o quadro de caveiras de Antônio Malta Campos (no alto) e o óleo de Michel Kikoïne (sobre o módulo amarelo) – entre os objetos, figuram vidros de Archimede Seguso, Fulvio Bianconi, Alvar Aalto e da Lalique
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
No quarto do casal, cadeira Superleggera, de Gio Ponti, comprada em leilão, aparador da Marcenaria Baraúna, tela (azul) de Paula Scavazzini e aquarela de Michel Kikoïne
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
Na sala do andar de cima, tela de Amilcar de Castro e cadeira Sertaneja, de Lina Bo Bardi, da Marcenaria Baraúna, compõem a decoração – atrás do móvel, o fechamento de aço corten e vidro caracteriza o desenho da frente e dos fundos da casa
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
Pelos interiores da residência, o conjunto de móveis, objetos, livros e obras de arte reflete o repertório apurado e o atual momento de vida do morador: João se casou com a advogada Vanessa Felicio e tem um filho, Tom, de 3 anos. A construção acolheu a nova configuração familiar de forma tranquila, pois foi pensada para atravessar gerações. “É uma arquitetura despida, com materiais simples, que privilegia a comunicação entre os espaços e o dia a dia das pessoas”, descreve Marcelo Ferraz. Ambientes abertos e bem iluminados fazem com que a casa, apesar de compacta, pareça maior. O uso de concreto aparente e paredes caiadas traz autenticidade e proporciona economia de recursos. Como não poderia deixar de ser, a cozinha desempenha um papel central no projeto. “Ela é escancarada para a sala. Tudo acontece em torno daquele balcão”, pontua o arquiteto.
+ A importância da decoração nos restaurantes de Renata Vanzetto
Na sala de TV, detalhe do aparador Ubatuba, design Claudio Corrêa para a Marcenaria Baraúna, com oratório caipira com imagens barrocas de Santa Teresa d’Ávila e Santo Antônio, e cartaz do Sesc Pompeia, desenhado por Lina Bo Bardi e Victor Nosek
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
Na área externa, mesa Catavento, de Francisco Fanucci, da Marcenaria Baraúna, junto a leões de barro de Nuca de Tracunhaém
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
João posa no balcão voltado para a sala de jantar, composta por cadeiras Girafa, de Lina Bo Bardi, Marcelo Ferraz e Marcelo Suzuki, e mesa Massaranduba, de Claudio Corrêa, tudo da Marcenaria Baraúna, pendente Urucum, de Rodrigo Moreira, e quadros de Vilmos Huszár (no alto) e Wassily Kandinsky (embaixo) – os três vasos de vidro colorido têm design de Archimede Seguso (vermelho) para a Seguso, de Carlo Scarpa (verde) e de Gio Ponti (em formato de garrafa) para a Venini
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
Embora em ritmo mais suave, João segue cozinhando para os amigos. “Com criança pequena, fica mais fácil receber do que sair”, pondera. Também permanece na agenda o grande evento anual da Casa do Carbonara: um jantar realizado em dezembro, pouco antes do Natal, preparado por chefs convidados, escolhidos entre os diversos talentos que o morador conheceu no universo da gastronomia. “Nesse dia, deixo a cozinha para os profissionais e a casa funciona como um restaurante mesmo, com a diferença de que não há dinheiro envolvido.” Bon appétit!
*Matéria originalmente publicada na edição de agosto/2025 da Casa Vogue (CV 475), disponível em versão impressa, na nossa loja virtual, e para assinantes no app Globo Mais
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O nome virou site, perfil no Instagram, canal no YouTube e até hoje abarca os projetos de João na área de gastronomia – ele já publicou artigos, deu palestras, organizou debates, criou uma websérie e idealizou e dirigiu, ao lado de Fabio Meirelles, o documentário A Terra e o Prato (2020), que traz depoimentos de chefs de diversos países sobre a relação entre comida, cultura local e sustentabilidade. O burburinho nas redes sociais causado por esses primeiros encontros fez muita gente acreditar que o endereço escondia um restaurante secreto. “Cheguei a receber um casal que me escreveu pedindo uma reserva com sete meses de antecedência. Como ninguém faz isso no Brasil, decidi cozinhar para eles”, declara.
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Vai construir ou reformar? Seleção Archa + Casa Vogue ajuda você a encontrar o melhor arquiteto para o seu projeto
Detalhe dos suportes de facas e utensílios
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
Em volta da lareira, banquinhos Caipira, de Francisco Fanucci, da Marcenaria Baraúna, quadro (branco) de Bruno Dunley, poltrona Jangada, de Jean Gillon, que João herdou do pai, dupla de cadeiras Tripé (edição de 1989), de Lina Bo Bardi, escultura amarela de Emanoel Araujo e, sobre a mesa de centro, obra de Ester Grinspum, tia do morador
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
O gosto pela culinária, João atribui à origem mineira da família paterna. Ele é filho do arquiteto Marcelo Ferraz, nascido em Carmo de Minas, e, durante a infância, passava as férias na casa da avó Aparecida, em Cambuí, na Serra da Mantiqueira (a matriarca estava prestes a completar 103 anos quando o neto foi entrevistado para esta reportagem). “Ainda criança, eu adorava ver a vó Cida preparar doce de fruta, lombinho assado, rosca…”, recorda-se João. “Cozinhar é uma parte importante da nossa vida familiar. Nas festas, todo mundo vai para o fogão”, completa. Do lado materno, vieram outros aprendizados. “Embora ninguém cozinhasse, meus avós gostavam de sair para comer em bons restaurantes. Fiz esse programa com eles muitas vezes, o que também foi fundamental em minha formação gastronômica”, afirma. Por volta dos 18 anos, houve a fase de mergulhar nos livros para descobrir novas técnicas e receitas. “Meu pai e meu irmão faziam piada nessa época, pois me tornei meio metódico e andava sempre com uma balança para pesar os ingredientes”, lembra.
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Detalhe do living, decorado com sofá Maria, de Marcelo Ferraz, da Marcenaria Baraúna, e tela de Paulo Monteiro
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
No living, a parede de concreto aparente expõe óleo de Paul Signac (à esq.), tela de Michel Kikoïne (ao centro), pôster original da Comuna de Paris (à dir.) e quadro de Emmanuel Nassar (no alto) – o avião é de Mestre Alvino, e, sobre o aparador da Marcenaria Baraúna, escultura de Amilcar de Castro
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
Outro ângulo da lareira evidencia a cadeira de Joaquín Torres-García
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
Além da gastronomia, João cultiva outras paixões. Formado em relações internacionais, fez mestrado em ciências políticas e doutorado em história. Durante um tempo, foi proprietário de galeria de arte. Com cabeça de pesquisador e olhar treinado para encontrar bons achados, mantém o hábito de vasculhar feirinhas, antiquários e catálogos de leilões. “Tenho uma tendência ao colecionismo, mas procuro me conter. Não há dinheiro nem espaço para tudo. Já me desfiz de muita coisa”, afirma. Entre os desapegos, esteve a poltrona Bowl, da arquiteta Lina Bo Bardi, original dos anos 1950, vendida ao acervo do MoMA de Nova York. “Lina era minha madrinha. Meu pai trabalhou com ela por 16 anos, depois foi diretor do Instituto Bardi por uma década. Fiquei feliz de colocar a peça num lugar onde ela pode ser apreciada por gente do mundo todo”, diz. Hoje, João é diretor da Marcenaria Baraúna, extensão do escritório Brasil Arquitetura, fundado por Marcelo Ferraz e Francisco Fanucci e responsável pelo projeto de sua casa. A empresa produz mobiliário sob medida e dispõe de um portfólio de design que inclui reedições autorizadas de criações de Lina.
+ Decor Stories: peças e artigos decorativos transformam a mesa posta
A biblioteca, localizada na edícula, recebeu estante da Marcenaria Baraúna, que reúne livros e obras de arte, como o quadro de caveiras de Antônio Malta Campos (no alto) e o óleo de Michel Kikoïne (sobre o módulo amarelo) – entre os objetos, figuram vidros de Archimede Seguso, Fulvio Bianconi, Alvar Aalto e da Lalique
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
No quarto do casal, cadeira Superleggera, de Gio Ponti, comprada em leilão, aparador da Marcenaria Baraúna, tela (azul) de Paula Scavazzini e aquarela de Michel Kikoïne
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
Na sala do andar de cima, tela de Amilcar de Castro e cadeira Sertaneja, de Lina Bo Bardi, da Marcenaria Baraúna, compõem a decoração – atrás do móvel, o fechamento de aço corten e vidro caracteriza o desenho da frente e dos fundos da casa
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
Pelos interiores da residência, o conjunto de móveis, objetos, livros e obras de arte reflete o repertório apurado e o atual momento de vida do morador: João se casou com a advogada Vanessa Felicio e tem um filho, Tom, de 3 anos. A construção acolheu a nova configuração familiar de forma tranquila, pois foi pensada para atravessar gerações. “É uma arquitetura despida, com materiais simples, que privilegia a comunicação entre os espaços e o dia a dia das pessoas”, descreve Marcelo Ferraz. Ambientes abertos e bem iluminados fazem com que a casa, apesar de compacta, pareça maior. O uso de concreto aparente e paredes caiadas traz autenticidade e proporciona economia de recursos. Como não poderia deixar de ser, a cozinha desempenha um papel central no projeto. “Ela é escancarada para a sala. Tudo acontece em torno daquele balcão”, pontua o arquiteto.
+ A importância da decoração nos restaurantes de Renata Vanzetto
Na sala de TV, detalhe do aparador Ubatuba, design Claudio Corrêa para a Marcenaria Baraúna, com oratório caipira com imagens barrocas de Santa Teresa d’Ávila e Santo Antônio, e cartaz do Sesc Pompeia, desenhado por Lina Bo Bardi e Victor Nosek
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
Na área externa, mesa Catavento, de Francisco Fanucci, da Marcenaria Baraúna, junto a leões de barro de Nuca de Tracunhaém
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
João posa no balcão voltado para a sala de jantar, composta por cadeiras Girafa, de Lina Bo Bardi, Marcelo Ferraz e Marcelo Suzuki, e mesa Massaranduba, de Claudio Corrêa, tudo da Marcenaria Baraúna, pendente Urucum, de Rodrigo Moreira, e quadros de Vilmos Huszár (no alto) e Wassily Kandinsky (embaixo) – os três vasos de vidro colorido têm design de Archimede Seguso (vermelho) para a Seguso, de Carlo Scarpa (verde) e de Gio Ponti (em formato de garrafa) para a Venini
Ruy Teixeira | Produção: Manu Figueiredo
Embora em ritmo mais suave, João segue cozinhando para os amigos. “Com criança pequena, fica mais fácil receber do que sair”, pondera. Também permanece na agenda o grande evento anual da Casa do Carbonara: um jantar realizado em dezembro, pouco antes do Natal, preparado por chefs convidados, escolhidos entre os diversos talentos que o morador conheceu no universo da gastronomia. “Nesse dia, deixo a cozinha para os profissionais e a casa funciona como um restaurante mesmo, com a diferença de que não há dinheiro envolvido.” Bon appétit!
*Matéria originalmente publicada na edição de agosto/2025 da Casa Vogue (CV 475), disponível em versão impressa, na nossa loja virtual, e para assinantes no app Globo Mais
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