Há anos que cientistas buscam uma alternativa ao plástico comum, que é altamente poluente e pode levar até 600 anos para se decompor na natureza. Uma das opções são os chamados bioplásticos, derivados de fontes renováveis, mas que normalmente esbarravam em empecilhos, como a baixa resistência e durabilidade, limitando as suas aplicações.
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Um estudo elaborado por pesquisadores da Universidade de Tecnologia Química de Shenyang, na China, parece ter resolvido esse problema. O trabalho, publicado em outubro na revista Nature Communications, mostra como eles conseguiram transformar o bambu em um plástico forte e com propriedades similares ao material convencional, o que aumenta as possibilidades de uso na indústria — incluindo a moveleira e decorativa — de forma mais ampla.
O bambu é uma matéria-prima renovável de rápido crescimento, o que é uma grande vantagem para a indústria
Freepik/Creative Commons
O método criado pelos chineses se difere de outros já desenvolvidos por não utilizar compostos tóxicos em sua produção. Ele consiste em adicionar solventes naturais para quebrar as ligações químicas do bambu, produzindo uma mistura de moléculas menores de celulose. Em seguida, adiciona-se etanol ao composto, fazendo com que as moléculas de celulose se reorganizem em um plástico resistente.
“Embora os bioplásticos derivados de biomassa sejam promissores, sua adoção em larga escala é dificultada por propriedades mecânicas inferiores, processabilidade limitada e dependência de matérias-primas que competem com a produção de alimentos. Aqui, apresentamos uma estratégia de engenharia molecular para fabricar plásticos moleculares de bambu (plásticos BM) de alta resistência por meio de um processo de moldagem regulado por solvente”, descreve o trabalho.
Segundo os estudiosos, o plástico BM é bastante resistente e durável, suporta altas temperaturas e oferece versatilidade na produção por meio de técnicas como injeção, moldagem e usinagem. “O plástico BM supera a maioria dos plásticos comerciais e bioplásticos em métricas mecânicas e termomecânicas”, aponta a pesquisa.
Estudiosos da China desenvolveram um plástico de bambu que pode ser reciclado e é biodegradável
Divulgação
O material ainda é biodegradável, se decompondo no solo em apenas 50 dias. Além disso, pode ser reciclado mantendo até 90% de resistência original. “Pode ser reciclado várias vezes, mantendo boa parte de suas propriedades originais, e também é biodegradável, podendo se decompor naturalmente em um período relativamente curto”, diz a professora Bianca Maniglia, pesquisadora do Laboratório de Biopolímeros e Fotoquímica do Instituto de Química São Carlos da Universidade de São Paulo (IQSC/USP).
Na avaliação da docente, essa nova tecnologia permite que o plástico de bambu seja produzido em larga escala com viabilidade econômica, equilibrando desempenho técnico e sustentabilidade ambiental. “Os custos de produção são considerados competitivos. Apesar de envolver um processo tecnológico mais elaborado, o uso de matéria-prima renovável e a possibilidade de reciclagem tornam o material economicamente viável”, ela afirma.
Outra vantagem do bambu é o seu rápido crescimento. “É uma planta disponível em abundância. O uso dessa matéria-prima reduz a dependência de derivados do petróleo e contribui para diminuir o acúmulo de resíduos plásticos no meio ambiente”, destaca Bianca.
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Mas, para ser realmente sustentável, o manejo precisa ser realizado de forma responsável, com colheita seletiva controlada, replantio, conservação do solo e respeito ao ciclo natural da planta. “O bambu se regenera rapidamente e não exige grande uso de defensivos agrícolas”, comenta Bianca.
“Em sistemas bem geridos, o bambu contribui para a restauração ambiental e pode substituir culturas mais intensivas. Porém, a demanda industrial crescente pode estimular monocultivos e uso de fertilizantes, o que reduz os ganhos ecológicos. A rastreabilidade da matéria-prima é, portanto, essencial para garantir coerência ambiental”, pontua Renato Carreira, professor do departamento de Química da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio).
Aplicações em decoração e arquitetura
Com aplicações variadas, o plástico de bambu pode ser utilizado em móveis, revestimentos, objetos de decoração, utensílios domésticos, embalagens e até componentes estruturais leves nos campos da arquitetura e engenharia.
“O material vem sendo testado e aplicado em projetos voltados à sustentabilidade, com foco em produtos moldados, embalagens ecológicas e elementos de design baseados em materiais de origem natural”, conta a docente.
O plástico de bambu criado na China é 100% verde e se decompõe no solo em apenas 50 dias
Divulgação
Apesar de o novo método chinês ser não-tóxico, Renato alerta para o risco de greenwashing de outros tipos de plásticos de bambu. O termo é usado quando o apelo sustentável do produto ou material mascara a complexidade química envolvida em sua produção.
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“É importante distinguir entre produtos que realmente reduzem o impacto e aqueles que apenas substituem madeira ou plástico tradicionais, sem ganhos ambientais comprovados. A incorporação de compostos sintéticos ou de colas tóxicas é um alerta frequente nesse setor”, frisa o químico.
Nem todo plástico de bambu é sustentável
O bambu é uma planta de crescimento rápido e com bom balanço de carbono, mas isso não garante sustentabilidade automática. “Quando o material final incorpora aditivos, colas sintéticas ou plastificantes persistentes, perde parte dessa vantagem. A sustentabilidade depende de uma avaliação completa do ciclo de vida — considerando o cultivo, o processamento, o uso e o descarte”, informa Renato.
Isso porque a fabricação de alguns plásticos de bambu envolve o uso de aditivos que não são de origem verde. “Em alguns casos, a produção utiliza solventes ou catalisadores potencialmente tóxicos. O impacto real, portanto, não está apenas no uso do bambu, mas também em como o processo é conduzido e na composição química final do produto”, argumenta o especialista.
O novo plástico de bambu é resistente e durável, suporta altas temperaturas e oferece versatilidade na produção
Freepik/Creative Commons
Muitos deles alcançam resistência comparável ou até superior a alguns termoplásticos, de acordo com Renato. O ponto fraco costuma ser a durabilidade sob umidade e radiação UV. “Para compensar isso, adicionam-se estabilizantes e agentes químicos — e é aqui que entra o dilema: esses aditivos podem aumentar a toxicidade e complicar o descarte ambientalmente seguro”, alerta.
Há também termoplásticos, como polipropileno, polietileno e ABS, nos quais o bambu entra apenas como reforço. Nestes casos, as vantagens estão na redução do uso de petroquímicos na produção, na melhor rigidez e no aspecto natural do produto.
“Mas o desempenho varia e nem sempre compensa o custo ambiental do processamento. Em alguns casos, o bambu é adicionado mais como apelo estético ou de marketing do que como ganho técnico real”, declara Renato.
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O químico destaca que o bambu é uma matéria-prima versátil e renovável, mas sua transformação em plástico não é automaticamente sustentável.
“Depende dos aditivos, do processo produtivo e do destino pós-consumo. Portanto, o desafio não é apenas ‘usar bambu’, mas também conceber sistemas de produção realmente limpos, rastreáveis e reversíveis. Só assim o bambu poderá cumprir a promessa de ser um aliado sólido na transição para uma economia mais circular”, ele finaliza.
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Um estudo elaborado por pesquisadores da Universidade de Tecnologia Química de Shenyang, na China, parece ter resolvido esse problema. O trabalho, publicado em outubro na revista Nature Communications, mostra como eles conseguiram transformar o bambu em um plástico forte e com propriedades similares ao material convencional, o que aumenta as possibilidades de uso na indústria — incluindo a moveleira e decorativa — de forma mais ampla.
O bambu é uma matéria-prima renovável de rápido crescimento, o que é uma grande vantagem para a indústria
Freepik/Creative Commons
O método criado pelos chineses se difere de outros já desenvolvidos por não utilizar compostos tóxicos em sua produção. Ele consiste em adicionar solventes naturais para quebrar as ligações químicas do bambu, produzindo uma mistura de moléculas menores de celulose. Em seguida, adiciona-se etanol ao composto, fazendo com que as moléculas de celulose se reorganizem em um plástico resistente.
“Embora os bioplásticos derivados de biomassa sejam promissores, sua adoção em larga escala é dificultada por propriedades mecânicas inferiores, processabilidade limitada e dependência de matérias-primas que competem com a produção de alimentos. Aqui, apresentamos uma estratégia de engenharia molecular para fabricar plásticos moleculares de bambu (plásticos BM) de alta resistência por meio de um processo de moldagem regulado por solvente”, descreve o trabalho.
Segundo os estudiosos, o plástico BM é bastante resistente e durável, suporta altas temperaturas e oferece versatilidade na produção por meio de técnicas como injeção, moldagem e usinagem. “O plástico BM supera a maioria dos plásticos comerciais e bioplásticos em métricas mecânicas e termomecânicas”, aponta a pesquisa.
Estudiosos da China desenvolveram um plástico de bambu que pode ser reciclado e é biodegradável
Divulgação
O material ainda é biodegradável, se decompondo no solo em apenas 50 dias. Além disso, pode ser reciclado mantendo até 90% de resistência original. “Pode ser reciclado várias vezes, mantendo boa parte de suas propriedades originais, e também é biodegradável, podendo se decompor naturalmente em um período relativamente curto”, diz a professora Bianca Maniglia, pesquisadora do Laboratório de Biopolímeros e Fotoquímica do Instituto de Química São Carlos da Universidade de São Paulo (IQSC/USP).
Na avaliação da docente, essa nova tecnologia permite que o plástico de bambu seja produzido em larga escala com viabilidade econômica, equilibrando desempenho técnico e sustentabilidade ambiental. “Os custos de produção são considerados competitivos. Apesar de envolver um processo tecnológico mais elaborado, o uso de matéria-prima renovável e a possibilidade de reciclagem tornam o material economicamente viável”, ela afirma.
Outra vantagem do bambu é o seu rápido crescimento. “É uma planta disponível em abundância. O uso dessa matéria-prima reduz a dependência de derivados do petróleo e contribui para diminuir o acúmulo de resíduos plásticos no meio ambiente”, destaca Bianca.
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Mas, para ser realmente sustentável, o manejo precisa ser realizado de forma responsável, com colheita seletiva controlada, replantio, conservação do solo e respeito ao ciclo natural da planta. “O bambu se regenera rapidamente e não exige grande uso de defensivos agrícolas”, comenta Bianca.
“Em sistemas bem geridos, o bambu contribui para a restauração ambiental e pode substituir culturas mais intensivas. Porém, a demanda industrial crescente pode estimular monocultivos e uso de fertilizantes, o que reduz os ganhos ecológicos. A rastreabilidade da matéria-prima é, portanto, essencial para garantir coerência ambiental”, pontua Renato Carreira, professor do departamento de Química da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio).
Aplicações em decoração e arquitetura
Com aplicações variadas, o plástico de bambu pode ser utilizado em móveis, revestimentos, objetos de decoração, utensílios domésticos, embalagens e até componentes estruturais leves nos campos da arquitetura e engenharia.
“O material vem sendo testado e aplicado em projetos voltados à sustentabilidade, com foco em produtos moldados, embalagens ecológicas e elementos de design baseados em materiais de origem natural”, conta a docente.
O plástico de bambu criado na China é 100% verde e se decompõe no solo em apenas 50 dias
Divulgação
Apesar de o novo método chinês ser não-tóxico, Renato alerta para o risco de greenwashing de outros tipos de plásticos de bambu. O termo é usado quando o apelo sustentável do produto ou material mascara a complexidade química envolvida em sua produção.
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“É importante distinguir entre produtos que realmente reduzem o impacto e aqueles que apenas substituem madeira ou plástico tradicionais, sem ganhos ambientais comprovados. A incorporação de compostos sintéticos ou de colas tóxicas é um alerta frequente nesse setor”, frisa o químico.
Nem todo plástico de bambu é sustentável
O bambu é uma planta de crescimento rápido e com bom balanço de carbono, mas isso não garante sustentabilidade automática. “Quando o material final incorpora aditivos, colas sintéticas ou plastificantes persistentes, perde parte dessa vantagem. A sustentabilidade depende de uma avaliação completa do ciclo de vida — considerando o cultivo, o processamento, o uso e o descarte”, informa Renato.
Isso porque a fabricação de alguns plásticos de bambu envolve o uso de aditivos que não são de origem verde. “Em alguns casos, a produção utiliza solventes ou catalisadores potencialmente tóxicos. O impacto real, portanto, não está apenas no uso do bambu, mas também em como o processo é conduzido e na composição química final do produto”, argumenta o especialista.
O novo plástico de bambu é resistente e durável, suporta altas temperaturas e oferece versatilidade na produção
Freepik/Creative Commons
Muitos deles alcançam resistência comparável ou até superior a alguns termoplásticos, de acordo com Renato. O ponto fraco costuma ser a durabilidade sob umidade e radiação UV. “Para compensar isso, adicionam-se estabilizantes e agentes químicos — e é aqui que entra o dilema: esses aditivos podem aumentar a toxicidade e complicar o descarte ambientalmente seguro”, alerta.
Há também termoplásticos, como polipropileno, polietileno e ABS, nos quais o bambu entra apenas como reforço. Nestes casos, as vantagens estão na redução do uso de petroquímicos na produção, na melhor rigidez e no aspecto natural do produto.
“Mas o desempenho varia e nem sempre compensa o custo ambiental do processamento. Em alguns casos, o bambu é adicionado mais como apelo estético ou de marketing do que como ganho técnico real”, declara Renato.
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O químico destaca que o bambu é uma matéria-prima versátil e renovável, mas sua transformação em plástico não é automaticamente sustentável.
“Depende dos aditivos, do processo produtivo e do destino pós-consumo. Portanto, o desafio não é apenas ‘usar bambu’, mas também conceber sistemas de produção realmente limpos, rastreáveis e reversíveis. Só assim o bambu poderá cumprir a promessa de ser um aliado sólido na transição para uma economia mais circular”, ele finaliza.



