Origem e estudos de Ramos de Azevedo
Nascido em Campinas, no interior paulista, filho de Ana Carolina de Azevedo e João Martins de Azevedo, Ramos partiu em 1875 para Ghent, na Bélgica, onde estudou engenharia civil e arquitetura na École Spéciale du Génie Civil. Após concluir sua formação, retornou ao Brasil no final do século 19 com o propósito de unir a arquitetura eclética e o estoicismo, contribuindo para a construção de uma nova São Paulo.
“Ramos traz todo o seu repertório europeu e aplica-o primeiro em Campinas, depois em São Paulo. Ele acompanha a transformação da própria Europa e traduz essa mudança para duas cidades que viviam um processo de metamorfose, passando de uma feição provinciana, marcada pela arquitetura colonial imperial, para uma metrópole moderna e cosmopolita em padrões europeus”, destaca Beatriz Bueno, professora, doutora e curadora da exposição Escritório Ramos de Azevedo: a arquitetura e a cidade, realizada em 2015, entre janeiro e março, em diferentes pontos da capital paulista.
Ramos de Azevedo foi um dos grandes nomes da arquitetura a remodelar São Paulo na era industrial
Picryl/Creative Commons
Entre obras públicas, edifícios culturais e residências sofisticadas, Ramos de Azevedo foi responsável por um repertório arquitetônico que trouxe ao Brasil a linguagem eclética europeia, inspirada no neoclássico, no gótico e no renascentista, mas sempre adaptada às demandas e ao clima tropical.
O escritório, a Escola Politécnica e o Liceu de Ramos de Azevedo
Para entender a dimensão de Ramos de Azevedo, é preciso observar os espaços onde suas ideias ganharam forma. O arquiteto não atuou sozinho: ao seu redor existia uma estrutura organizada, quase pedagógica, que deu origem a um verdadeiro ecossistema de criação e formação profissional.
Em 1886, o paulista fundou um escritório que, em 1907, passou a se chamar Escritório Técnico Ramos de Azevedo & Companhia, consolidando-se como um dos maiores e mais influentes na arquitetura e construção do país. Funcionava como uma verdadeira indústria criativa: arquitetos, engenheiros, mestres de obra, desenhistas e artesãos trabalhavam lado a lado. O espaço formou gerações de profissionais e deu origem à chamada “escola Ramos de Azevedo”, responsável por difundir seu modo de projetar por todo o Brasil.
Essa lógica formadora se estendia para fora do escritório e se conectava diretamente à Escola Politécnica de São Paulo, instituição que Ramos ajudou a erguer e consolidar. A Poli, como seria conhecida, simbolizava o avanço científico e tecnológico da cidade e reforçava o compromisso do arquiteto com a educação e o progresso.
Por meio do Liceu de Artes e Ofícios, tomou forma a produção artística que deu identidade às obras de Ramos de Azevedo. Foi ali que nasceram os ornamentos, vitrais, esculturas, gradis e detalhes decorativos que transformaram seus edifícios em verdadeiras obras de arte.
“O escritório sempre atuava em todas as etapas, do projeto à execução, cuidando até dos mínimos detalhes. Por meio do Liceu, ele formava artesãos responsáveis pelos trabalhos de marcenaria, serralheria artística e ferragens presentes em suas construções”, comenta Beatriz.
A partir de 1895, ao assumir a direção do Liceu de Artes e Ofícios, ele tornou-se também articulador de uma visão que deixou bases sólidas para a continuidade da produção arquitetônica em São Paulo. “O novo programa proposto por Ramos, intitulado Reforma do Ensino, promoveu mudanças radicais nos regulamentos da escola, introduzindo novas disciplinas no ensino secundário e, especialmente, no curso de artes e ofícios”, conta Fernanda Carvalho, coordenadora do Acervo Histórico do Liceu.
São Paulo nas obras de Ramos de Azevedo
Explorar a capital paulista pelos projetos de Ramos de Azevedo é mergulhar em alguns dos cenários mais emblemáticos da cidade. São espaços que entrelaçam história e arte, carregados da grandiosidade típica da virada do século 19 para o 20.
“As obras foram feitas para durar e até hoje marcam a paisagem porque foram construídas com um olhar de futuro, de muita longevidade e muita qualidade. São verdadeiros tesouros arquitetônicos”, pontua Beatriz.
Theatro Municipal de São Paulo
O Theatro Municipal foi inaugurado em 1911 e foi inspirado na Ópera de Paris
Webysther/Wikimedia Commons
Localizado na Praça Ramos de Azevedo, no Centro de São Paulo, o Theatro Municipal foi inaugurado em 1911 e se tornou o grande cartão-postal da fase eclética paulista. Uma das obras mais célebres de Ramos de Azevedo, o edifício, inspirado na Ópera de Paris, reúne mármores, vitrais, dourados e esculturas produzidas em parceria com o Liceu de Artes e Ofícios.
Palácio das Indústrias (atual Catavento Cultural)
O Palácio das Indústrias, erguido a partir de 1911, tem influência neorrenascentista
Ana Paula Hirama/Wikimedia Commons
Erguido na Avenida Mercúrio a partir de 1911, o Palácio das Indústrias foi concebido para simbolizar a força produtiva do estado paulista. Com influência neorrenascentista, o edifício impressiona pela monumentalidade, marcada por torres e arcadas que permanecem imponentes até hoje. Atualmente, abriga o Museu Catavento, oferecendo ao visitante uma experiência que combina arquitetura histórica com ciência interativa.
Mercado Municipal de São Paulo (Mercadão)
O Mercado Municipal de São Paulo foi inaugurado em 1933 e hoje se tornou um famoso ponto turístico da cidade
Webysther/Wikimedia Commons
Localizado na Rua da Cantareira, no Centro de São Paulo, o Mercado Municipal foi inaugurado em 1933 e rapidamente se tornou um ícone da vida cotidiana.
Pinacoteca de São Paulo (Prédio Luz)
A Pinacoteca foi projetada em 1900 por Ramos e hoje abriga um dos museus mais importantes da América Latina
Fritz Kintz/Hector.carvalho/Wikimedia Commons
Localizada na Praça da Luz, a construção projetada em 1900 por Ramos de Azevedo para sediar o Liceu de Artes e Ofícios abriga hoje um dos museus mais importantes da América Latina. A combinação entre arquitetura histórica e intervenções contemporâneas transformou o edifício em um verdadeiro ícone da capital paulista.
Casa das Rosas — Espaço Haroldo de Campos de Poesia e Literatura
Casa das Rosas, patrimônio tombado pela cidade de São Paulo, atualmente funciona como centro cultural dedicado à poesia
Paulo SP/Wikimedia Commons
Localizada na Avenida Paulista, a Casa das Rosas foi projetada por Ramos de Azevedo para servir como residência familiar em estilo eclético francês. Atualmente, funciona como centro cultural dedicado à poesia.
Obras de Ramos de Azevedo se tornaram patrimônio histórico
Diversas residências projetadas pelo arquiteto são tombadas pelo município, incluindo, ainda, o edifício da Escola Politécnica e a Casa das Rosas, também reconhecidos como patrimônio histórico.



