Solar da Marquesa de Santos: a casa da amante de Dom Pedro I que virou museu em SP

Cercado de lendas urbanas, o Solar da Marquesa de Santos é um dos grandes edifícios históricos dos primórdios da capital paulista que permanece de pé. Localizado na região da Sé, hoje o espaço é a sede do Museu da Cidade de São Paulo, mas já foi o lar de uma das figuras mais emblemáticas da cidade, o que lhe rendeu uma série de histórias obscuras.
Domitila de Castro Canto e Melo, mais conhecida como Marquesa de Santos, viveu na residência por vários anos junto ao seu marido, o Brigadeiro Rafael Tobias de Aguiar. Apesar de muitos acharem que o romance proibido dela com o imperador Dom Pedro I aconteceu no Solar, isso não é verdade: ela comprou a casa anos após encerrar a relação como amante do monarca.
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“A Marquesa ocupou o Solar entre os anos de 1834 e 1867. Nesse período, ela já havia se desvencilhado da relação com Dom Pedro I e consolidou o local como sua principal morada para criar sua família, juntamente com seu marido, que foi presidente da Província de São Paulo”, conta o educador Wellington Cunegundes, do Museu da Cidade de São Paulo.
Quadro do século 19 retrata Domitila de Castro Canto e Melo, conhecida como a Marquesa de Santos
Francisco Pedro do Amaral/Wikimedia Commons
Outra lenda urbana famosa, a de que o Solar abriga um suposto “túnel secreto” usado pela Marquesa para se encontrar com o Imperador em outra residência, é uma fantasia criada pela população à época, mas que perdura até hoje.
“Não há história relacionada a um túnel. É possível dizer que o Solar, por se localizar à beira de uma colina, tem seu térreo ao nível da rua Roberto Simonsen, e abaixo dela foi construído um subsolo que abriga boa parte do setor administrativo do museu atualmente, e que em sua parte mais baixa tem a testada dos fundos para a rua Dr. Bitencourt Garcia”, fala Wellington.
O Solar da Marquesa de Santos foi o lar de Domitila de Castro Canto e Melo, amante de Dom Pedro I
Camila Leite Oliveira/Wikimedia Commons
Muitos acreditam que o Solar da Marquesa de Santos é “mal-assombrado”. Juliana Valente, influenciadora à frente da página Terror Com Tudo, conta que o lugar tem a fama de receber “visitas” da falecida marquesa e de seu marido.
“Dizem que os fantasmas do casal circularam pela exposição de inauguração do museu, que, não por acaso, apresentava uma mostra temporária sobre a vida dela e do Brigadeiro”, comenta Juliana.
A história do Solar
Os primeiros registros da construção remontam ao século 18; a documentação mais antiga sobre o edifício data de 1802.
“Porém, há indícios que apontam a existência de um conjunto de habitações na mesma rua entre os anos de 1739 e 1754, mas é impreciso indicar que se trataria das casas que seriam modificadas para se tornarem o Solar”, diz Wellington.
Um dos pátios internos do Solar da Marquesa de Santos, no centro da capital paulista
DéboraGLima/Wikimedia Commons
Sua importância histórica vai além da célebre moradora, revelando aspectos que tratam da São Paulo colonial. “Ele nos indica a existência de um padrão para a ocupação das colinas à margem do rio Anhangabaú, demarcando uma centralidade de um importante acesso usado por diversas populações que circulavam entre o interior e o litoral paulista”, relata o educador.
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O Solar também tem grande importância arquitetônica, pois é uma das poucas edificações remanescentes feitas em taipa de pilão — construção de paredes utilizando matérias-primas cruas, como terra —, e com algumas alvenarias em taipa de mão ou pau a pique — paredes formadas por uma estrutura de madeira entrelaçada preenchida com barro amassado.
O Solar da Marquesa de Santos é tombado pelo Patrimônio Histórico de São Paulo desde 1971
DéboraGLima/Wikimedia Commons
O Solar atual se origina de duas construções em taipa do século 18, que tinham janelas guarnecidas por gradis de madeira, também conhecidos como muxarabis, visto que não havia a presença do vidro. Ao longo da história, a edificação foi passando por diversas alterações.
A primeira grande transformação aconteceu com a união dos sobrados para se tornar um amplo casarão. Quando abrigou os sacerdotes do Mosteiro de São Bento, teve algumas das paredes eliminadas para se tornar uma moradia coletiva.
Hoje o Solar da Marquesa de Santos abriga o Museu da Cidade de São Paulo, com diversas mostras e exposições
Flickr/Alejandro/Creative Commons
“Porém, em seguida, quando abrigou a sede da The São Paulo Gas Company, ou Companhia Paulista de Gás, houve considerável mudança na sua fachada, com a abertura de vitrines e grandes portões de cortina de aço”, revela Welligton.
“Nestes últimos períodos é que temos a presença da alvenaria em tijolo, indicando um período importante para a cidade, onde as construções em terra são progressivamente substituídas por grandes edificações, executadas com a influência da imigração do final do século 19 e início do 20, que implantou a produção de tijolos cerâmicos em olarias. Também é significativa, como foi colocado anteriormente, a presença de elementos metálicos de ferro fundido”, completa ele.
Restauração do Solar
Tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (CONDEPHAAT), em 1971, o Solar é elemento importante do antigo triângulo histórico da capital paulista, mantendo uma relação intrínseca com o Pátio do Colégio, o Beco do Pinto e o rio Tamanduateí, além de estar na conformação da Praça da Sé.
Visão frontal da entrada do Beco do Pinto, com o Solar da Marquesa de Santos à direita
Annamotaa/Wikimedia Commons
Os primeiros trabalhos significativos de restauro aconteceram em 1991, quando a fachada foi refeita, buscando remontar aspectos neoclássicos anteriores à Gas Company.
“Hoje, temos uma fachada neoclássica, com ampla platibanda de alvenaria que esconde seus beirais, além de aplicações em concreto, balcões de aço, portadas e janelas amplas, com folhas de madeira trabalhada em carpintaria do século 19”, aponta Wellington.
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O último restauro foi realizado entre 2008 e 2011, quando se buscou fazer a manutenção e reparos em pisos, esquadrias, forro e telhado. “Todos esses registros estão aparentes para os visitantes, devido ao trabalho pioneiro de arqueologia urbana que buscou explorar a materialidade da edificação para que ela pudesse estar aparente”, destaca o educador.
O Museu da Cidade de São Paulo, que fica no Solar, abriga boa parte do acervo que abrange bens móveis, documentação fotográfica, gravações orais, livros e documentos relativos à capital paulista. A visitação, assim como as ações e exposições, são gratuitas e abertas de terça-feira a domingo, das 9h às 17h.

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